26 de abr. de 2010

O Iluminado


Nascido em uma ilustre família de sábios e santos do sul da Índia (dentre eles Appaya Dikshitar, célebre expoente das filosofias Vedanta e Shaivasidhanta), filho de Vengu Aiyer e Parvathiammal, Sivananda nasceu Kuppuswami Aiyer, uma criança que desde cedo manifestava afinidade com o mundo espiritual. 


Seu pai, um brâmane que todos os dias fazia seu puja (ritual de oferenda) a Shiva, tinha como assistente o pequeno Kuppuswami. 


Desde menino atraía todos à sua volta, seja para as muitas brincadeiras que inventava ou espontâneos discursos. Na adolescência, o gosto por atividades físicas levou-o a procurar um mestre de artes marciais. Kuppuswami o honrava com grande devoção, trazendo-lhe guirlandas de flores e reconhecendo-o como o seu primeiro guru, mas foi obrigado a manter essa relação em segredo, pois sendo o guru uma pessoa pertencente a uma casta inferior, seria malvisto por seus pais, que eram brâmanes. 


Na juventude, estudou medicina e tornou-se um dedicado médico. Na faculdade era editor de uma revista de saúde. Seu primeiro desafio como médico seria administrar um hospital nos seringais na Malásia. A maioria dos pacientes era de trabalhadores indianos que ali viviam em condições precárias. O atendimento médico dispensado por ele era de uma natureza muito especial, pois além dos medicamentos e tratamentos convencionais, ele era capaz de passar toda a noite ao lado do leito do paciente entoando bhajans (cânticos devocionais) ou mantras. 


Em sua vida privada, Kuppuswami tinha todos os confortos que a profissão permitira. Regularmente, como é de bom costume na tradição védica, Kuppuswami gostava de receber visitantes em sua residência, fazendo jus ao mantra athiti devo bhava (o hóspede é tratado como Deus). Muitos destes eram sadhus ou monges itinerantes, que em troca de hospedagem concediam bênçãos e ensinamentos ao anfitrião. Nessa época Kuppuswami já era um entusiasta praticante autodidata de Yoga, conhecendo vários asanas e pranayamas por livros ou breves instruções recebidas de seus hóspedes. Porém, uma dessas visitas viria a marcar a sua vida definitivamente. 


O sadhu em questão era um swami que lhe deixou um livro que tratava do Advaita-Vedanta, ou conceito não dual da realidade absoluta, que o levou a questionar seriamente o seu propósito de vida. Repentinamente ele perdeu a atração pelas coisas que o rodeavam, considerando que mesmo a sua vocação médica era limitada em relação ao tipo de serviço que ele almejava render à humanidade. Ele pensava “Estou curando as pessoas fisicamente, mas como posso curá-las espiritualmente?” E resolveu retornar à Índia em busca de uma nova identidade para si próprio. Assim que deixou seus pertences com os familiares, ele embarcou na sua viagem como sadhu, percorrendo os muitos lugares sagrados da Índia. 


Viajando a pé, seguiu à risca as recomendações tradicionais de nunca ficar mais do que três dias em cada localidade, alimentando-se somente das esmolas. Ao chegar a Varanasi, no famoso templo de Kashi Vishwanath, ele teve uma visão mística na qual o próprio deus Shiva o instruiu a prosseguir a sua peregrinação rumo ao norte, próximo ao Himalaia. Ao chegar a Rishikesh, no início dos anos 20, imediatamente sentiu-se em casa, sabendo que ali era o lugar onde desenvolveria seu sadhana (prática espiritual). Foi ao banhar-se nas águas do rio Ganges que teve o encontro mágico com seu guru, Swami Vishwananda Saraswati, um velho e respeitável renunciante que imediatamente reconheceu no jovem aspirante o potencial de um grande yogi. 


Tendo recebido o nome iniciático de Swami Sivananda, dentro da ordem Saraswati de Shankaracharya, seu guru apenas o instruiu a permanecer em Rishikesh e praticar as instruções recebidas nas poucas horas que estiveram juntos. Com total diligência e fé nos ensinamentos recebidos, Swami Sivananda iniciou o que seriam anos de intensa prática e realizações. Em sua biografia ele conta que muitos dos métodos empregados não seriam recomendáveis à maioria dos seus discípulos, mas no estado de consciência no qual se encontrava, estes fluíam com entrega e bem-aventurança. 


Um dos seus sadhanas preferidos constituía-se em ficar imerso até a cintura nas águas do Ganges durante o inverno, praticando japa (meditação com um cordão de contas) desde as 3 horas da manhã! Sivananda passava a maior parte do tempo absorto entre horas de meditação, estudo intenso e vigorosa prática de Hatha Yoga. 


Era extremamente metódico em seus horário e disciplinas, e mantinha todas as experiências anotadas em um diário. Assim, logo começou a escrever pequenos panfletos que dava algum jeito de imprimir e distribuir. Embora imerso no seu próprio caminho de autorrealização, nunca deixou de atender pessoas necessitadas de seus cuidados médicos.


Notoriamente fazia questão de atender um campo de leprosos, que mesmo os médicos locais temiam visitar. Não demorou muito tempo para que começasse a atrair aspirantes a discípulos. Na época, sua reputação de jivanmukta (yogi liberado enquanto vivo) já se espalhava pela Índia onde seus panfletos ou relatos de pessoas que o haviam encontrado chegassem. Swami Sivananda seguia sem planos de abrir ashrams. Preferia seguir o seu trabalho de uma forma silenciosa e potente. 


Aos poucos que se aventuravam a receber suas instruções diretas, impunha disciplina e condições espartanas, filtrando uma grande quantidade de curiosos. Quando o número de visitantes começou a perturbar sua paz, decidiu mudar-se para a outra margem do Ganges em Rishikesh, onde havia apenas uma selva. Este ambiente, no entanto, não desencorajou seus seguidores mais sinceros, e nos anos 30, ali mesmo surgiu, entre algumas edificações precárias, o Sivananda Ashram. Sivananda inspirava seus estudantes por força do seu próprio exemplo pessoal. Sua vida era como um livro aberto, todos podiam vê-lo humilde, sereno, seja servindo ou cantando kirtans. 


Em suas próprias palavras exaltadas: “Vi a Deus em meu próprio Ser. Negando os nomes e formas, o que permanece é existência-conhecimento-bem-aventurança absolutas (sat-chid-ananda) e nada mais. Contemplo-O em todas as partes, não existem véus. Sou uno, não há dualidade. Vivendo em meu próprio ser, minha felicidade está além de qualquer descrição. O mundo dos sonhos desapareceu. Existo apenas”. Em 1936 foi inaugurada a Divine Life Society (Sociedade da Vida Divina), nome escolhido pelo próprio Swami Sivananda para designar o espírito das práticas ali conduzidas, que constituía o seu “Yoga da Síntese”. 


Este poderia ser subdividido em quatro abordagens distintas do Yoga, que na visão conciliadora de Swami Sivananda seriam práticas complementares e necessárias para o desenvolvimento do ser como um todo: Karma Yoga (Yoga da ação), Bhakti Yoga (Yoga da devoção), Raja Yoga (Yoga da meditação) e Jñana Yoga (Yoga do conhecimento). 


Todos eles já se encontram devidamente delineados na escritura clássica da Bhagavad Gita, sobre a qual Swami Sivananada também escreveu um importante comentário. Swami Sivananda dava uma ênfase importante ao exercício do trabalho desinteressado como forma de purificar as inúmeras tendências latentes do ego. Assim, seus discípulos, ao chegarem ao seu ashram, eram imediatamente submetidos a este “tratamento”. 


Com um temperamento devocional bastante ecumênico, Swami Sivananda também permitia que várias manifestações religiosas pudessem ocorrer no ashram em ocasiões especiais. Swami Sivananda aceitava como visitantes pessoas de todas as castas, credos ou sexo, incluindo mães solteiras ou viúvas. 


Igualmente foi um dos primeiros a conceder iniciação na vida monástica a mulheres. Em sua imensa obra literária, Swami Sivananda resgatou aspectos até então mantidos secretos da prática do Hatha Yoga e do Raja Yoga de Patañjali. Fez questão de escrever seus primeiros livros, como A prática do Yoga, como verdadeiros manuais práticos, tornando-os acessíveis ao grande público. 


No livro Concentração e meditação, ele chegou a publicar suas próprias experiências obtidas em estado elevado de consciência.“A meditação regular abre as avenidas do conhecimento intuitivo, faz com que a mente seja calma e serena, despertando um sentimento extático que põe o estudante do Yoga em contato direto com o supremo Purusha. Muitas dúvidas serão aclaradas por si mesmas através da prática da meditação.” No famoso livreto Thought Power – O poder do pensamento, ele nos diz: “Todo impulso da mente, todo pensamento é transmitido às células. Estas se vêem extraordinariamente influenciadas pelas distintas condições ou estados mentais. 


Se há confusão, depressão e outros pensamentos ou emoções negativos na mente, estes são telegraficamente transmitidos através do sistema nervoso a todas as células do corpo”. Empreendedor mesmo para os moldes atuais, fez funcionar dentro do ashram uma biblioteca, uma gráfica, um museu do Yoga, laboratório fotográfico e um hospital beneficente, atendendo pacientes que vinham tratar até cirurgias de olhos. Ali também havia uma farmácia ayurvédica e homeopática. Dentre os seus mais importantes discípulos, que viriam a dar continuidade ao seu trabalho em anos futuros, temos os nomes de Swami Chidananda e Swami Krishnananda (nomeados presidente e secretário do ashram após seu mahasamadhi “A meditação regular abre as avenidas do conhecimento intuitivo, faz com que a mente seja calma e serena, despertando um sentimento extático que põe o estudante do Yoga em contato direto com o supremo Purusha. 


Muitas dúvidas serão aclaradas por si mesmas através da prática da meditação.” Juntos, enquanto ainda viviam no ashram de Swami Sivananda, eles formavam o corpo docente da chamada Yoga Vedanta Forest University, uma instituição cujo objetivo era transmitir os mais nobres aspectos do Yoga e do Vedanta a alunos vindos de todas as partes. Swami Vishnudevananda ficou encarregado do ensino do Hatha Yoga, pois dominavacom maestria essa ciência. 


Foi também o primeiro discípulo a chegar ao Ocidente no final dos anos 50, fundando os Sivananda Yoga Vedanta Centers. Da mesma forma, cada um de seus discípulos trouxe sua contribuição perene ao estabelecimento de uma consciência global em relação ao Yoga. Sem nunca ter saído da Índia, Sivananda alcançou praticamente todas as culturas. Desde o início ele mantinha contato com pessoas em vários países, escrevendo instruções em forma de cartas à mão, que foram mais tarde compiladas em um livro chamado Sivananda Upanishads. Os últimos anos da sua vida foram marcados por enfermidades naturais para quem passara tantos anos em abnegado sacrifício em prol dos demais. 


Contam os seus discípulos que a sua força de vontade era tamanha, que se necessário era capaz de simplesmente se levantar e cumprir tarefas, como se nada estivesse lhe perturbando, logo após retomando a sua posição de “doente”. Tendo seu mahasamadhi em 14 de julho de 1963, suas últimas palavras foram “attach, detach” (apegue, desapegue), no sentido de desapegar-se do corpo transitório e apegar-se ao espírito imortal. Ele será sempre lembrado por todos os aspirantes do Yoga pelo seu amor, humor e sabedoria. Julio Falavigna (Gopala) Os afluentes de Sivananda 


O sistema de autodesenvolvimento integral é conhecido como Sivananda Yoga de Síntese, e integra técnicas das quatro grandes áreas da Yoga: Karma, Bhakti, Raja e Jñana. Conheça os principais discípulos e seus feitos: Swami Vishnu-devananda (1927–1993). Foi o primeiro discípulo a sair da organização DLS para fundar sua própria organização. A convite de seus alunos de Hatha Yoga que frenquentavam suas aulas no Sivananda Ashram, ele partiu para o Ocidente em 1957 (vide info no site www.sivananda.org). Fundando no Canadá, em 1959, uma organização independente, a International Sivananda Yoga Vedanta Centers, Swami Vishnu desenvolveu um sistema de Yoga focadoprincipalmente em 12 posturas e cinco princípios relativos à Hatha e Raja Yoga. 


Ele escreveu quatro livros. Por ter um nome parecido, esse estilo foi chamado por muitos de Sivananda Yoga, mas ele também é conhecido com o nome Vishnu-devananda Yoga. Swami Satchidananda (1914–2002), após abrir filiais da DLS a pedido de Swami Sivananda, ele também fundou sua própria organização, a Integral Yoga International Institutes and Centers, nos Estados Unidos. Foi um dos grandes divulgadores do Yoga no Ocidente, tendo inclusive cantado o mantra OM com 500 mil pessoas no Festival de Woodstock.

Swami Satchidananda fundou várias organizações e divulgou a mensagem de Swami Sivananda pelo mundo. Ele desenvolve um sistema parecido com o de seu guru, abrangendo ensinamentos de Hatha, Bhakti, Karma, Raja e Jnana, e o denominou Yoga Integral. Escreveu 24 livros sobre Yoga tradicional. Swami Venkatesananda (1921–1982) Autor de mais de 60 livros. Foi um dos discípulos mais próximos de Swami Sivananda, ficando com ele 17 anos e sendo seu secretário particular. Então viajou pelo mundo todo divulgando a mensagem de seu guru e estabelecendo centros de Yoga na Europa, África do Sul, Nova Zelândia e Austrália. Foi um grande divulgador da autêntica Sivananda Yoga de Swami Sivananda sem fazer alterações. Swami Satyananda (1923–2009). 


Nascido em Almora, Uttar Pradesh, Índia. Em 1943 encontrou Swami Sivananda em Rishikesh e tornou-se um renunciante. Após anos de intenso serviço a Swami Sivananda, deixou a organização DLS em 1955 para peregrinar pela Índia. Fundou sua própria organização, a International Yoga Fellowship, em 1956, e a Bihar School of Yoga em 1963, em Bihar, Índia. Nos 20 anos seguintes viajou pelo mundo divulgando os ensinamentos sagrados do Yoga. Escreveu mais de 80 livros. Swami Satyananda desenvolveu um sistema amplo baseado nos ensinamento de seu guru com ensinamentos de Tantra, Yoga e Vedanta, e denominou este estilo de Satyananda Yoga. Swami Shivapremananda (1925–) 


Foi um grande divulgador dos ensinamentos de Swami Sivananda no Ocidente – Estados Unidos, Canadá, Suíça, Alemanha, Inglaterra, Irlanda, França, Itália, Argentina, Uruguai e Chile, entre outros. Escreveu 21 livros. Seguindo o mesmo sistema de Yoga de Swami Sivananda, mas com mais ênfase para Yogaterapia, denominou-o Yoga Integral. Swami Jyotirmayananda (1931–) Instituiu o Yoga Research Foundation em 1969, em Miami, Estados Unidos. Também não podemos deixar de mencionar Swami Chinmayananada e Swami Omkarananada, entre muitos outros mestres que seguiram Swami Sivananda. 
Prof. Sivaswuarupa
Gopala - Sivaswarupa

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