4 de out. de 2007

É preciso mesmo tanta dor?


É preciso mesmo tanta dor?
Impossível tentar responder a essa pergunta se não nos abrirmos para uma infinidade de informações que contextualizam o amor ao longo da história e em diferentes culturas. A limitação do tempo se impõe a nós como uma pequena fatia do todo, sem que possamos visualizá-lo em nenhum momento e para nenhum propósito. Fico, às vezes, imaginando a frustração de uma criança que espera ansiosamente pelo bolo de aniversário com a cara do Super-Homem, e quando chega à mesa o bolo já está totalmente fatiado e a única coisa que pode ver é um pequeno pedaço do que parece ser o escudo e talvez um borrão que lembre sua capa. Convenhamos que é mortal, o máximo da frustração.

A cultura histórica nos oferece, felizmente, a possibilidade de olharmos pelo menos uma parte do todo, ainda fragmentos, porque o que está à frente não é possível ver. Nem sempre o sentimento de amor foi valorizado na vida das pessoas, ou pelo menos, a maneira como entendemos amor hoje. O ideal romântico criou a idéia da felicidade absoluta, causa de sofrimento para muitos. A vida é bela, todos os meus sonhos vão se realizar, serei popular, querida e escolhida pelo mais belo rapaz, que cairá a meus pés de tanto amor. Ele é forte, protetor e trará a felicidade e realização de todos meus sonhos. Nossa casa será linda, com lindos vasinhos na janela, teremos belos e doces filhinhos, nos manteremos sempre com tesão um pelo outro e caminharemos por vias suaves, cheirosas e seguras.
Essa temática está incutida em todos nós. Vemos isso nos livros, obras de arte, filmes e nos lindos contos de fada que recheiam a mente de gerações e gerações de pessoas ao longo do mundo. A princesa um dia será descoberta pelo príncipe que a resgatará da dor, lhe trará a vida e a felicidade. Antes disso, ela é sempre rejeitada e sofre, sofre muito. Sofrer é fundamental até nas estórias atuais, cheias de paixões, traições, dor, morte, para depois de tanta dor viver-se, enfim, a glória da felicidade eterna. Foram felizes para sempre.

Pense por um instante e responda com sinceridade. Você vive ou viveu o amor dessa forma? Com essas expectativas? Com essas cobranças?

Enfim, com um conceito idealizado de que "amar é...". Estou citando as mulheres, mas existe o análogo masculino, diferente desse, porém igualmente irreal e importante. Para complicar mais o quadro, essa distorção não se dá só no quesito amor, mas na formação de todos nossos conceitos, sistema de crenças, estruturado ao longo da convivência com uma determinada cultura. Através dessa lente olharemos para o mundo, para nós mesmas e, desse olhar, dependerá o tipo de sentimento que teremos frente às questões.
Eda Fagundes - psicóloga clínica
Picture by Mikhail Larionov

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