Nunca consegui entender direito por que um amor acaba. Para Nelson Rodrigues (o maior frasista brasileiro de todos os tempos), “se acabou é porque não era amor”.
De todas as conjecturas, suposições e explicações que ouvi sobre o assunto, talvez a de Nelson seja realmente a mais sensata. E a mais radical, como tudo, aliás, que levava a sua assinatura. Mas, mesmo levando em conta a veracidade da frase rodriguiana, comecei a me perguntar de tempos para cá: quais são os indícios de que um amor acabou (mesmo não sendo amor, já que acabou)?
Semana passada, fui passear com minha superlinda amiga Natali no Jardim Zoológico Municipal. Era uma manhã azulada, realmente bonita, com uma luz propícia para a observação das cores que revestem os animais: as raias dos tigres saltavam aos olhos de tão definidas, as listras das zebras pareciam pinturas em movimento.
De repente, sem que nenhum aroma desagradável tivesse nos atingido (estávamos a milhas da jaula do gambá), Natali virou-se para mim com a seguinte frase: “Olha, Mantraman, terminei com o meu último namorado por causa do cheiro. Pode parecer completamente imbecil, o cara até que era legal, inteligente, bonito, mas, toda vez que eu ia me encontrar com ele, lembrava-me do seu cheiro e quase desistia de ir. Da última vez, não fui. Liguei e simplesmente disse que não queria mais namorar com ele”.
Ele ainda ficou alguns dias à procura de Natali para saber o porquê da súbita separação. Mas ela, com vergonha de lhe falar a verdade, disse-lhe simplesmente que precisava ficar sozinha por um tempo. Comigo também aconteceu algo semelhante tempos atrás. Só que a garota em questão não era uma namorada com quem eu me encontrava duas ou três vezes por semana: ela morava comigo e dormíamos juntos todas as noites.
E o curioso dessa história é que, à medida que fomos nos desentendendo por motivos que não cabem aqui explicar, e a nossa convivência foi ficando cada vez mais difícil e inviável, seu cheiro foi, proporcionalmente, ficando mais e mais insuportável para o meu olfato. Lembro-me que, quando nos separamos definitivamente, tive de fazer uma faxina de uma semana até que seu odor desaparecesse por completo da casa.
Outro indício de que um amor terminou é quando o senso de humor começa a ficar escasso.
O poeta modernista Oswald de Andrade escreveu o mais curto e mais contundente poema em língua portuguesa sobre o assunto. O título é Amor. E o poema em si: Humor. Nada mais. Quando um casal perde de vista a grande diversão que é oamor e começa a levar a coisa a sério, os leitores podem ter certeza: o resultado será estresse com separação imediata. Não estou querendo dizer que devemos nos comportar como hienas ou bobos alegres que riem de tudo e de todos. O senso de humor é uma arma sutil que, quando usado com inteligência e criatividade, pode, além de prolongar, deixar o relacionamento mais leve, e, é claro, divertido.
A mulher que mais amei em toda a minha vida foi a mulher com quem eu mais me diverti. Ela tinha um apuradíssimo senso de humor, algo nato. Rir com a pessoa amada é uma das melhores coisas que Deus colocou sobre a face da Terra. E o seu odor, ah, tanto o perfume que usava quanto o que exalava de seus poros mais secretos entorpeciam meus sentidos e me deixavam completamente louco. Eu disse no começo deste parágrafo “a mulher que mais amei”.
Mas eis um amor que parece que ainda não acabou. Talvez porque era amor. Amor mesmo.
Ciro PessoaPicture by Alfred Gockel
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