10 de mar. de 2008

La Belle du Jour

Numa dessas segundas-feiras em que a gente tem a impressão de que deveria ter ficado em casa, eu estava realmente irritada. Alguns obstáculos no trabalho, pouco tempo para muita tarefa e eu atrasada para um compromisso...

Saí dirigindo rumo ao meu destino; tensa, ligada no piloto automático. Parei no semáforo do cruzamento entre a França Pinto e a Domingos de Moraes, zona Sul de São Paulo. De repente, ouço uma voz do lado de fora dizendo:

- Posso cantar uma música para você?

Olhei assustada, pensando "Lá vem pedido de dinheiro, de novo!". Fiquei constrangida em negar um pedido tão diferente e disse que sim, afinal ele tinha até o violão! Antes, ele avisou: é do Alceu Valença. E começou a tocar aquela, justamente aquela que eu adoro – La Belle du Jour.

O sujeito de pele morena, vestido de maneira extremamente simples, cantava só pra mim em plena tarde, na louca cidade. A cena era, no mínimo, mágica. Desliguei o rádio do carro; o celular tocou e eu não atendi. A voz dele ia apaziguando meu coração agitado. Lembrei-me de que teria de dar o tal "trocado", mas raramente ando com dinheiro. Encontrei na bolsa R$0,75 (isso mesmo: setenta e cinco centavos!). Quando ele terminou, eu estava um tanto atordoada com o encantamento provocado por aquela surpresa. O que um artista como ele estaria fazendo num semáforo, cantando em troca de gorjeta?!? Sorri, agradecida por tão singelo presente e, ao mesmo tempo, chateada porter tão pouco para "pagá-lo". E ele ainda me disse, ao pegar as duas moedas:
- Muito obrigado por me ouvir. Você é muito simpática!
O semáforo abriu e fui embora, mas não consegui parar de pensar no que havia acontecido. Já não estava tensa. Todo o cenário do meu dia havia se transformado por causa daquele homem e seu dom. Eu me sentia a própria Belle du Jour.Fiz aquele mesmo caminho durante vários dias depois, em horários diversos...mas nunca mais vi aquela 'estrela' com violão nas mãos e magias escondidas na boca para dar de presente a quem ele escolhesse.
Hoje, fico me perguntando se fora realmente um homem ou um anjo. Talvez fosse mais racional pensar que ele simplesmente migrou para outro semáforoqualquer, mas prefiro acreditar que tenha sido um anjo. Afinal, a vida é exatamente aquilo que acreditamos que ela seja. Bem melhor, portanto, pensar em encantamentos, presentes, surpresas, anjos efadas, como se a nossa história fosse enredo de um lindo filme campeão de bilheterias.
Gosto de pensar que o Grande Diretor me convidou para ser a protagonista do filme que vivencio todos os dias, pois assim fica muito mais romântico, interessante, empolgante e inspirador. E é por isso que, a despeito de qualquer tristeza, de todas as dores e os eventuais problemas, continuo acreditando no amor. E desejo que você também acredite, porque basta que desejemos o amor... e haverá amor!
Rosana Braga
Picture by Jennifer Wiley

4 comentários:

teresa disse...

E aí a gente de repente pára e começa a ver q existem pessoas na rua e isso nos faz um bem enorme!
Bjsss

Ricardo dos Santos disse...

A magia, literalmente, está nos olhos de quem vê.
Músicas, prosas, poesias, declarações nos transpassam todos os dias a todo momento, o que nos impede de perceber e a alucinação do dia a dia.
Como diz Saint-Exupéry, "as pessoas grandes não compreendem nada sozinhas"

Anônimo disse...

Navegando pela internet descobri este texto.
Mas o que eu escrever aqui não vai atingir a tamanha veracidade do comentário do José Filho.
É muito gostoso ler histórias assim.

Anônimo disse...

Engraçado.. li o texto ao som de "Where is my love" da Cat Power.

LinkWithin

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...