19 de set. de 2008

A evolução e o trabalho gerencial

O estudo de Darwin oferece possibilidades de conhecer e aprender a distinguir os comportamentos, principalmente os que não podemos mudar, para administrá-los melhor. A Teoria da Evolução propicia entender os comportamentos que estão na nossa estrutura: a competição, a cooperação, a sedução, a traição e muitos outros. A completar 150 anos, a obra de Darwin vem sendo tema de mostras e congressos no mundo e no Brasil. A Universidade de Cambridge disponibilizou, neste ano, sua obra completa (http://darwin-online.org.uk), apresentando o autor à era do conhecimento. Esses fatos reforçam o caráter inovador e atual de seus estudos sobre o comportamento das espécies, da nossa natureza humana. Darwin foi homenageado em vida por suas publicações em geologia, botânica e zoologia, mas não pela teoria da evolução, que só foi mais aceita nos meios científicos na década de 1940, com a Moderna Síntese. Muito dos conteúdos investigados pode ser assimilado no trabalho gerencial que exercemos atualmente. O foco deste artigo é exatamente este: evidenciar quanto podemos ganhar integrando a teoria da evolução à gerência. Darwin precisou ser um bom gerente. Ele nos surpreende, nos dias atuais, com sua capacidade de levantar dados, testá-los, replicar, organizar e trabalhar com colaboradores – em todo o mundo. Após a publicação do livro que o tornou famoso, A Origem das Espécies, em 1859, foi preciso muitas lutas em um nível tal que chegou a levar um de seus defensores, T. H. Huxley, a ser chamado de “buldogue de Darwin”. Atualmente, ainda enfrenta muita rejeição pelo grande público, conforme atestam os quatro DVDs, Evolução, com 2 horas de duração cada, produzidos pela Scientific American e recentemente distribuídos nas bancas no Brasil. (em www.pbs.org, há dados sobre o assunto). A Teoria da Evolução é um princípio explicativo da nossa verdadeira realidade, como espécie (filogenia) e como pessoa durante uma vida (ontogenia). Darwin trabalhou estes dois vieses, e muito sobre comportamentos conscientes e inconscientes. Comportamento é um tema muito abrangente. Pode ser dos vegetais, dos animais, das rochas, do solo, do clima ou das águas. Neste sentido, a teoria da evolução é uma teoria de comportamentos. Pesquisar, observar, procurar, testar, replicar, para intuir hipóteses e continuar com novas pesquisas, é muito diferente de “achar que é”. É o aprendizado contínuo, e ele provou isto durante sua vida e com seus livros até os seus últimos dias . Uma das funções básicas do trabalho gerencial é cada um de nós, como gerentes, aprender a conhecer nossa realidade: talentos, limitações, comportamentos das pessoas com as quais nos relacionamos. A tribo é uma empresa, as outras tribos estão em competição ou cooperação, como na vida e no trabalho. Em Animals and Plants under Domestication, de 1868, ele estuda como a natureza produz modificações, nossas limitações e nossas competências. Em 1838, Darwin iniciou estudos e anotações nos seus cadernos de um livro que precisou de 34 anos de elaboração: A Expressão das Emoções no Homem e nos Animais, publicado em 1872. Consiste na descrição dos fatos observáveis, nas inúmeras contribuições que recebeu ao redor do mundo. Apresenta seu método de pesquisa e a elaboração de testes para estudos de comportamentos e de ações, que podem ser aplicados ao treinamento gerencial. Uma das conclusões finais, sobre como lidar com emoções, na sua proposta de estudarmos para nos tornarmos conscientes de como as expressamos, é um bom exemplo. Se agirmos sem um aprendizado consciente (com observações, testes de como somos, replicações para verificar se o que aprendemos é real), não conheceremos a profunda relação entre o que sentimos e como manifestamos exteriormente nossas emoções nas ações. Em A Origem do Homem, de 1871, diz: “O progresso parece depender do concurso simultâneo de muitas condições favoráveis, demasiado complexas para que permita seu acompanhamento”. Não há fórmulas para o sucesso, e este não é replicável nas ações humanas, depende de muitos fatores, gerando complexidade, profundidade, interatividade, e inovação. Só podemos dizer que uma ação teve êxito quando esta concretiza. Nesse extenso livro, dedica mais da metade do texto à seleção sexual. Uma das suas conclusões é: “O poder de fascínio do macho tem sido eventualmente mais importante para a sua evolução que a capacidade de derrotar seus pares nos combates pela fêmea” (Idem, p. 183). Assim, corrige o erro de não ter valorizado a importância da cooperação na evolução entre os animais e, em especial, desde o início da humanidade, acrescentando que nenhuma tribo cresce, quando o roubo e a traição são considerados normais. Darwin, desde jovem já revelava seu talento para estudos e pesquisas do comportamento humano. Na passagem do “Beagle” pelo Rio de Janeiro, em 1832, com 23 anos de idade, registrou nos seus Diários um modo de ser brasileiro que perdura até os dias atuais: acreditamos sermos capazes de tudo agradar e tudo fazer, até a hora do vamos ver, quando criamos as inúmeras desculpas e justificativas. Durante sua estadia numa fazenda no Rio Macaé, escreveu sobre uma briga, onde o proprietário iria separar os homens e vender as suas mulheres e crianças num leilão público. Foi um outro interesse que surgiu e impediu a ação. E, assegura que era um homem que em humanidade e bons sentimentos era superior à maioria. “Pode-se dizer que não há limites para a cegueira advinda do interesse e hábitos egoístas.” Menciona, a seguir, um caso, aparentemente sem importância, que o impressionou mais do que uma crueldade. Numa travessia de balsa, tentando se fazer compreender na companhia de um escravo, começou a falar alto, a gesticular e passou a mão perto do rosto dele. Este homem grande e forte se sentiu amedrontado, cerrou os olhos e baixou os braços para receber pancadas. “Este homem havia sido treinado para suportar uma degradação mais abjeta do que a escravidão do animal mais indefeso.” Nós podemos modificar comportamentos sociais, mas os que possuímos e que nos identificam como espécie ainda não temos condições de alterar. O estudo de Darwin oferece possibilidades de conhecer e aprender a distinguir os comportamentos, principalmente os que não podemos mudar, para administrá-los melhor. Podemos procurar as evidências da complexidade que sempre existiu - nós é que não tínhamos consciência. As vantagens competitivas das espécies e as estratégias das várias espécies. Quando uma espécie pára de evoluir, ela está propícia a desaparecer, o que acontece também às empresas. A evolução, na natureza, não é para melhor, mas para crescer seu poder no ambiente. A Teoria da Evolução propicia entender os comportamentos que estão na nossa estrutura: a competição, a cooperação, a sedução, a traição e muitos outros. Há um grande potencial, ainda inexplorado, de compreendermos o que Darwin escreveu há mais de cem anos. Podemos efetivamente inovar na vida e no trabalho, se entendermos como evoluímos e como modificamos através dos tempos. Darwin disse que as evidências da evolução estarão à nossa disposição, se decidirmos procurá-las.
Jorge Raggi

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