20 de mai. de 2009

Não cumprir o combinado

Vicente Forte
Fernando Pessoa dizia: 
"Quem não vê bem uma palavra não pode ver bem uma alma." 
Infelizmente na nossa cultura as pessoas não cumprem o que combinam e normalmente fica por isso mesmo, pois reclamar não é bem-visto. Algumas até aceitam com naturalidade aparente. É claro que não existe quem não se contrarie com algo que foi prometido e não foi cumprido. As pessoas se sentem traídas e não reclamam para não se sentirem por baixo, fingem que não ligam numa tentativa de dar pouca importância ao outro. Engraçado, pois qual o ganho de se sentir desprezado e não reagir? 

O medo de perder nos impede muitas vezes de colocar a verdade. Não cumprir o que se combinou é um ato de violência emocional e um desrespeito ao outro, que causa no indivíduo traído uma angústia muito grande, faz mal deixar pra lá e só reforça um funcionamento adoecido e desrespeitoso. 

 Tudo começa quando os pais não cumprem o que prometeram aos filhos e ainda acham natural, pois são pais e eles é que mandam. Quem ensina os filhos a mentir são os próprios pais quando não cumprem o combinado com eles. E depois reclamam que os filhos mentem e não sabem por quê. Se por acaso não puder cumprir, é dever conversar e negociar. Nada pior que uma criança perder a credibilidade em relação aos pais, isso é uma violência e os pais são responsáveis por isso. O que parece estar nos faltando é um pacto ético em que todas as pessoas deveriam se comprometer a ser menos espertas e mais honestas e justas. Esse pacto ético incluiria coisas muito simples e que todas as pessoas deveriam se obrigar, tais como: cumprir a palavra, horários e prazos comprometidos, não mentir, ser honesto no trabalho e fora dele. 

Não seria preciso nada mais complexo do que isso, assim, sem dúvida, nossas relações seriam bem mais verdadeiras. Como todos querem enganar a todos, somos enganados e não percebemos isso. Eu finjo que prometo e você finge que acredita na minha promessa e ainda falam que isso é ser um bom negociante! Parar de enganar, de ludibriar, de levar vantagem em tudo, de prometer o que não se poderá cumprir é uma exigência que as pessoas deveriam ter consigo e com os outros. A crise que estamos vivendo é uma crise ética. Ninguém mais acredita em ninguém e consequentemente em nada. Em nome dos nossos medos e vaidades, justificamos tudo e nada se cumpre totalmente. E seria tão simples se todos nós em nosso próprio benefício decidíssemos mudar. Sem esse pacto ético continuaremos nessa luta de esperteza em que todos sabem que estão perdendo, mas fingem estar ganhando. 

 Muitos dirão que o pacto ético deveria começar dos outros. Se não assumirmos uma postura de mudança, independente dos outros, vamos outra vez fingir e acreditar na mentira. Quem promete, cumpre; e se não pode cumprir, não se deve prometer. Encerro com o pensamento de Alexandre Dumas: "Por vezes é penoso cumprir o dever, mas nunca é tão penoso como não cumpri-lo". 
Antônio Roberto

2 comentários:

Pr. Silas Figueira disse...

Excelente postagem, parabéns! A ética não depende da ótica, como dizem certas pessoas, mas depende do caráter.
Fique na Paz!
Pr Silas

Um dia depois: hoje. disse...

O post já tem mais de sete anos, então talvez ninguém leia este comentário, mas cheguei aqui justamente procurando um texto sobre pais que não cumprem as promessas aos filhos porque acham que o fato de serem pais justifica tudo. Esse tipo de pais, exploradores e injustos, ou dificultam a emancipação emocional dos filhos ou acabam forçando que os filhos recorram ao afastamento dos pais. Dificultam a emancipação emocional porque durante muito tempo, o filho, frustrado, sofre à espera de um tratamento justo dos pais. Espera, por exemplo, que o pai pague um empréstimo que tomou com o filho; espera que o pai não fale mal do emprego ou do casamento do filho etc. Esse tratamento nunca muda e, enquanto espera uma mudança, o filho sofre. O sofrimento só para ou quando o filho aceita ser explorado, pois entende que a relação nunca vai mudar, ou quando o filho se afasta e passa a negar os pedidos dos pais. Neste último caso, a sociedade tende a justificar os pais, envelhecidos e doentes, e condenar o filho, sem entender que foi uma relação disfuncional que gerou o afastamento.

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