É, sem dúvida, a maior descoberta da física de partículas dos últimos 30 anos", disse o físico brasileiro Sérgio Novaes, professor titular da Unesp e líder do grupo de física de alta energia da universidade
Em um evento histórico, cientistas do LHC, o maior colisor de partículas do mundo, anunciaram nesta quarta-feira a descoberta de uma nova partícula fundamental da matéria. Os resultados são consistentes com o "bóson de Higgs", nome dado à partícula que ajuda a explicar como o mundo à nossa volta possui massa. Se o achado for mesmo o Higgs, significa que o modelo científico para explicar os fenômenos físicos, chamado Modelo Padrão da Física de Partículas, está correto. Não é um evento corriqueiro na ciência. A última vez que os cientistas detectaram uma nova partícula da natureza foi no fim da década de 1990, chamada quark top.
O evento dá continuidade a uma série de resultados divulgados ao longo dos últimos sete meses. Foi transmitido a partir das 4 da manhã de quarta-feira pela internet e chegou a entrar nos trending topics do twitter. No Brasil, a Universidade Estadual Paulista (Unesp) montou um telão com tradução e comentários para jornalistas em São Paulo.
No fim de 2011, os físicos já haviam vislumbrado o bóson de Higgs, mas os resultados não eram tão confiantes quanto os de agora. De acordo com os físicos, desta vez a certeza é de 5 sigma em dois experimentos independentes, o que na linguagem científica quer dizer que a chance de a descoberta ser uma obra do acaso é uma em 3 milhões. É o suficiente para classificá-la como descoberta formal.
Momento histórico - Diante de um auditório lotado (que contou com a presença ilustre de Peter Higgs, físico britânico que propôs o Bóson de Higgs na década de 1960) em Genebra, na Suíça, físicos dos dois maiores experimentos do LHC, chamados CMS e Atlas, confirmaram a presença de uma nova partícula entre 125 e 126 vezes mais pesada que o próton, a partícula que forma o núcleo dos átomos, e que parece possuir todas as características do bóson de Higgs.
"Sabemos que é um bóson, o mais pesado já encontrado", disse o porta-voz do CMS, Joe Incandela. Os bósons são partículas que descrevem a força de interação entre outras partículas que formam a matéria, como os elétrons e os neutrinos. Um deles, o único ainda não observado em experimento, é o bóson de Higgs. "Acho que a encontramos", disse o próprio Higgs após a apresentação dos grupos.
Será? - De acordo com o físico Sérgio Novaes, professor titular da Unesp e líder do grupo de física de alta energia da universidade, a empolgação dos cientistas é grande. "É, sem dúvida, a maior descoberta da física de partículas dos últimos 30 anos", disse, por meio de teleconferência. Novaes acompanhou o anúncio no auditório em Genebra. "Essa nova partícula 'cheira' a Higgs e se parece com o Higgs, mas seria ela o Higgs?", disse Hélio Takai, também por teleconferência, pesquisador brasileiro que trabalha no Brookhaven National Laboratory, nos Estados Unidos.
Se a nova partícula não for o Higgs previsto pelo Modelo Padrão, existem outros sistemas teóricos que explicam a existência da partícula. É por isso que o capítulo derradeiro da busca pela partícula final do Modelo Padrão da Física de Partículas não acabou. Agora, os físicos do CERN vão determinar as características do novo bóson.
"Será uma nova era da física de partículas", disse Pedro Mercadante, professor da Universidade Federal do ABC. "É um passo muito importante porque, apesar de os resultados apontarem para o Bóson de Higgs, os cientistas precisam confirmar se as propriedades da nova partícula são as esperadas" disse. "A nova partícula precisa ser explicada pelos cálculos do modelo padrão", explicou Takai. "Se houver acordo entre teoria e prática, poderemos dizer que trata-se do bóson de Higgs. Isso pode ocorrer ainda este ano."
Saiba mais
BÓSON DE HIGGS
O bóson de Higgs é uma partícula subatômica prevista há quase 50 anos. Após décadas de procura, os físicos ainda não conseguiram nenhuma prova de que ela exista. O Higgs é importante porque a existência dele provaria que existe um campo invisível que permeia o universo. Sem o campo, ou algo parecido, nada do que conhecemos existiria. Os cientistas não esperam detectar o campo -- em vez disso, eles esperam encontrar uma pequena deformação nele, chamada bóson de Higgs.
De acordo com a teoria, o campo de Higgs foi 'ligado' um trilionésimo de segundo depois que o Big Bang iniciou a criação do universo. Antes desse momento, nenhuma partícula tinha massa e elas vagavam caoticamente na velocidade da luz. Quando o campo de Higgs foi ligado, algumas partículas começaram a sentir uma espécie de 'arrasto' à medida que se movimentavam, como se estivessem presas em uma cola cósmica. Ao se apoiar nas partículas, o campo deu a elas massa, fazendo com que elas se movessem mais devagar.
Esse momento foi crucial na formação do universo porque permitiu que as partículas se reunissem e formassem todos os átomos e moléculas que existem atualmente. Mas o campo de Higgs é seletivo. Partículas da luz, os fótons, se movem pelo campo como se ele não existisse. Como o campo não se apoia sobre os fótons, as partículas ficam sem peso e destinadas a se mover por aí na velocidade da luz para sempre. Outras partículas, como os quarks e os elétrons, são influenciadas pelo campo e ganham massa no processo.
Marco Túlio Pires - Veja
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