3 de nov. de 2010

Tango

Um relatório elaborado por Cynthia Quiroga, psicóloga colombiana (o cantor Carlos Gardel morreu em 1935 na colombiana Medellín), integrante da Universidade de Frankfurt (Alemanha, terra onde foi inventado o bandonenón) afirma que o tango eleva o desejo sexual. A Universidade recomenda o tango para casais com problemas de baixa testosterona. Sexo à parte, o tango – ritmo musical do rio da Prata (pois é praticado em ambas margens, a uruguaia e a argentina) – foi declarado Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco. “O tango é uma dança que não é dorsal como o flamenco. O tango é postero-pélvico…sua representação é um simulacro erótico”. (do escritor espanhol Rafael Salillas em 1898) “…Dança-se entre um homem e uma mulher, mas sem cópula”.(Salillas, 1898) Para o escritor Jorge Luis Borges, o tango era “uma forma de caminhar pela vida”. Para o poeta Enrique Santos Discépolo, “um pensamento triste que pode ser dançado”. No exterior, o tango é a música emblemática que representa a Argentina, embora o mesmo gênero musical também seja símbolo do vizinho do outro lado do rio da Prata, o Uruguai. Os argentinos se ufanam da definição dada pelo filósofo americano Waldo Frank, que sustentou que o tango é “a dança popular mais profunda do mundo”. A palavra tango talvez seja a mais associada à Argentina em todo o planeta. A crise econômica de dezembro de 2001 foi chamada de “efeito tango” pela imprensa mundial. O caráter fatalista e pessimista que muitos argentinos exercem diariamente sobre a política, a economia e suas próprias vidas pessoais também é apontado como “um tango”. Mais do que triste, o tango é introvertido e introspectivo, ao contrário de outras danças populares que são extrovertidas e eufóricas. Para o escritor Ernesto Sábato, “somente um gringo pode fazer a palhaçada de aproveitar um tango para conversar e se divertir”. Segundo o autor, “um napolitano dança a tarantela para se divertir. O portenho dança um tango para meditar sobre seu destino”. O tango é multifacético. Suas letras falam da mãe “santa”, da turma de amigos, das ruas do bairro e da pérfida – e perdida – mulher que os abandonou. Mas além disso, o tango também fala do hedonismo e da aparência, das divisões sociais e dos picaretas. Ele também é frequentemente satírico, com letras que disparam ácidas farpas contra tudo e contra todos. Nascimento Na Argentina (no Uruguai a História é outra), mais do que ‘argentino’, o tango é portenho, já que o interior da Argentina seria melhor representado por outros ritmos, como o chamamé, o malambo e a zamba. O bairro da Boca não foi o berço do tango, ao contrário do que indicam certas lendas, especialmente de guias turísticos estrangeiros. O tango surgiu ao redor de 1877 no bairro de Montserrat, situado entre a Casa Rosada e o atual Congresso Nacional. Na época, ali residiam os descendentes dos escravos negros que haviam sido liberados em 1813. Em Montserrat, também chamado de “barrio del Mondongo”, os afro-argentinos organizaram-se em associações beneficentes, que de noite – em barracos de sapé – preparavam festas para angariar fundos. Nesses eventos, tocavam batucadas lânguidas, que para os escandalizados vizinhos brancos da área eram danças “luxurientas” e “indecentes” na coreografia. As reuniões em Monserrat-Mondongo muitas vezes acabavam subitamente com a intervenção da polícia, que aparecia para “colocar ordem” no lugar. Na época de carnaval as associações de afro-argentinos saíam às ruas para dançar ao som da batucada, denominada na região do rio da Prata como “candombe”. A rivalidade dos grupos – cada um queria mostrar que era melhor na coreografia – provocava confrontos sangrentos nas ruas. Por este motivo, depois de anos de incidentes, o governo ordenou a dissolução das associações. Sem poder sair às ruas, os afro-portenhos organizaram lugares exclusivos de dança, os “tambos”. Com esta palavra começa a polêmica sobre a origem do tango. Para alguns “tangólogos”, “tango” viria de “tambo”. Para outros, vem de “Xango”, ou “Xangô”, deus africano da guerra. A própria palavra “tango”, com essa grafia, apareceu em 1836 no “Diccionario Provincial de Voces Cubanas”. O livro define “tango” como “a reunião de negros para dançar ao som de seus tambores ou atabaques”. Outra teoria indica que “tango” vem de “tambor”. A polêmica e a discussão são elementos altamente cotados na mesa dos argentinos. Portanto, abundam versões sobre o assunto. Uma teoria indica que “tango” vem de “tang”, palavra pertencente a um dialeto africano que poderia ser traduzida como “aproximar-se, tocar”. Curiosamente, outra versão sustenta que a palavra vem do latim “tangere”, que também significa “tocar”. No espanhol antigo, “tangir” equivale a tocar um instrumento. Para complicar, no século XIX existia na Espanha um “tango andaluz”. E no México, no século XVIII, uma dança com o mesmo nome. Nenhuma dessas teorias (há várias teorias adicionais sobre a origem da palavra) foi comprovada. Os argentinos continuam dançando este gênero sem se preocupar por sua etimologia. Desta forma, os afro-portenhos tiveram que resignar-se a ficar dentro de seus “tambos”, dançando o embrião daquilo que em poucas décadas seria o tango tal como o conhecemos hoje em dia. A forma de dançar era – de certa forma – vagamente similar ao samba brasileiro atual: dança solta, eventualmente segurando o/a parceiro/a, além de muito requebro. Mas, nesse momento em que essa forma prototípica do tango está em plena ebulição nos lugares de encontros dos afro-argentinos, ocorre uma guinada que seria fundamental para o desenvolvimento do tango: o surgimento do “compadrito” nos “tambos”.
Ariel Palacios

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