24 de dez. de 2010

Oração do Agradecimento


Amo a vida, que é bela e é consentida. 

Muito obrigada, Senhor, pelo que me deste, pelo que me dás! Muito obrigada pelo pão, pelo ar, pela paz! Muito obrigada pela beleza que meus olhos veem no altar da natureza! Olhos que fitam o ar, a terra e o mar. Que acompanham a ave fagueira que voa ligeira pelo céu de anil, E se detém na terra verde salpicada de flores em tonalidades mil! 

Muito obrigada, senhor, porque eu posso ver o meu amor! Diante de minha visão, detecto os cegos, Que se atormentam na escuridão, que se debatem na solidão, que sofrem na multidão Por eles eu oro, e a ti imploro com comiseração Eu sei que depois desta lida, na outra vida, Eles também enxergarão! Obrigada pelos ouvidos meus que me foram dados por Deus. 

Ouvidos que ouvem o tamborilar da chuva no telheiro, A melodia do vento nos ramos do salgueiro, Ouvidos que ouvem a música do povo que desce do morro na praça a cantar E a melodia dos imortais, que a gente ouve uma vez e não esquece nunca mais Diante de minha audição, pelos surdos, eu formulo uma oração; 

Eu sei que depois desta dor, no teu reino de amor, Eles também escutarão! Muito obrigada, Senhor, pela minha voz Mas também pela voz que ama, que canta, que consola, que legisla, que alfabetiza, que ensina, que canta uma canção E teu nome profere com dúlcida emoção! Diante da minha melodia, deixa-me rogar Pelos que sofrem de afasia, pelos que não cantam de noite, não falam de dia. 

Oro por eles porque eu sei que depois desta prova, na vida nova, Eles também cantarão! Muito obrigada, senhor, pelas minhas mãos! Mas também pelas mãos que aram, que semeiam, que agasalham. Mãos de ternura que libertam da amargura Mãos que apertam mãos, Mãos dos adeuses, Mãos de sinfonias, de psicografias, mãos de cirurgia, mãos de poesias, Mãos que atendem a velhice, a dor, o desamor, Mãos que numa noite fria, cuidam ou lavam louça numa pia, Mãos que à beira de uma sepultura abraçam alguém com ternura numa hora de amargura Mãos que acolhem ao seio do corpo, um filho alheio, sem receio. 

Pelos meus pés, que me levam a andar sem reclamar. Muito obrigada, Senhor, porque posso bailar! Diante de meu corpo perfeito te quero louvar Olho para a terra e vejo aleijados, amputados, marcados, desesperados, paralisados… Eu posso andar! Por eles eu oro e a ti imploro Eu sei que depois dessa expiação, Na outra reencarnação, eles também bailarão. Muito obrigada, senhor, pelo meu lar! É tão maravilhoso ter um lar… não importa se este lar é uma mansão, Um ninho, uma casa no caminho, um bangalô, seja lá o que for! Importante é que dentro dele exista a presença da harmonia e do amor. 

O amor de pai, de mãe, de marido e esposa, de filho, de irmão… A companhia de alguém que lhe estenda a mão, Mesmo que seja o amor de um cão, Pois é tão triste viver na solidão! Mas se não tiver ninguém para amar, um teto pra me agasalhar, Uma cama para repousar… mesmo assim, não reclamarei, Nem blasfemarei. Simplesmente direi: Obrigada Senhor, porque nasci. Obrigada Senhor, porque creio em Ti. Pelo teu amor, muito obrigada Senhor!
Divaldo e Amália Rodrigues

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