24 de jul. de 2009

Novo prognóstico para o câncer pode ser uma quimioterapia mais longa

Médicos e empresas farmacêuticas estão se movendo em direção ao tratamento contínuo com drogas de pacientes de câncer, mesmo quando eles não precisem urgentemente dos medicamentos. Isso seria algo bem diferente da prática atual, de interromper o tratamento quando o câncer está sob controle e reiniciá-lo em caso de piora da doença. A estratégia é chamada de terapia de manutenção - como se fossem ajustes periódicos com o objetivo de evitar falhas num veículo. Médicos afirmam que isso poderia prolongar o período em que os tumores ficam sob controle, ajudando o câncer a se transformar numa doença crônica que pode ser acompanhada, mesmo se não for curada. Apesar de a terapia de manutenção não ser algo completamente novo, seu uso está crescendo, em parte porque algumas das drogas mais recentes de combate ao câncer são mais toleráveis que os medicamentos tóxicos do passado, e podem ser tomadas por períodos mais longos. Por exemplo, no encontro anual da Sociedade Americana de Oncologia Clínica, ocorrido recentemente, médicos encheram um enorme auditório para um debate sobre se é hora de adotar a terapia de manutenção para o câncer de pulmão, a maior causa de morte por câncer do país. Outros tipos da doença para qual a terapia de manutenção está sendo usada ou experimentada incluem câncer de ovário, mieloma múltiplo e linfoma não-Hodgkin. No entanto, alguns especialistas afirmam que, em muitos casos, o uso prolongado de drogas não tem sido comprovadamente associado ao prolongamento da vida. Em vez disso, pode ser que pacientes de câncer fiquem mais sujeitos a efeitos colaterais e dezenas de milhares de dólares em gastos adicionais. Também existe a preocupação de que os tumores possam se tornar resistentes a uma droga usada por um longo período. "Geralmente, quanto mais, melhor, tanto em relação à dose quanto à duração potencial", diz Susan L. Kelley, chefe médica da Multiple Myeloma Research Foundation, que patrocina pesquisas sobre tratamentos para o mieloma múltiplo. No entanto, ela afirma que "existem vários tipos de custo para o paciente e para o sistema de saúde, quando administramos essas drogas por um longo período". Lawrence H. Einhorn, professor da Indiana University, relata que muito da pressão pela terapia de manutenção vem da indústria farmacêutica - que deseja que as drogas "sejam usadas o mais cedo possível e pelo maior tempo possível". Executivos dessas empresas reconhecem que a terapia significaria vendas maiores. "Essa oportunidade claramente reverte o jogo", declara Brian P. Gill, vice-presidente de comunicação corporativa da Celgene, que está testando sua droga Revlimid para o tratamento de manutenção do mieloma múltiplo. Ele falou para investidores numa conferência, em março. No entanto, os executivos e muitos médicos afirmam haver um bom raciocínio por trás da defesa da terapia de manutenção. Apesar de os tratamentos variarem com o tipo de câncer, muitos pacientes agora recebem vários ciclos iniciais de quimioterapia. Então, se o câncer regride, ou mesmo se o tumor simplesmente para de crescer, a terapia é interrompida. Ela somente é reiniciada, geralmente com drogas diferentes, se o câncer começa a piorar novamente. Essa estratégia evoluiu em parte porque as antigas drogas de quimioterapia eram tão tóxicas que os pacientes muitas vezes precisavam tirar "férias" do tratamento. "Entretanto, se pensarmos de forma prática, você não precisa dar 'férias' ao tumor", diz Colin Goddard, diretor da OSI Pharmaceuticals, que tenta posicionar sua droga Tarceva, contra o câncer de pulmão, para uso na terapia de manutenção. Alguns pacientes de câncer recebem de braços abertos a terapia de manutenção - alguns precisam dela desesperadamente, na luta contra a doença. O que os pacientes acham? "Eu era uma daquelas pessoas com um medo enorme de parar a quimioterapia", disse Barbara Platzer, 71 anos, de St. Louis, que tem câncer de ovário. Então, quando seus seis ciclos iniciais de quimioterapia terminaram com a remissão do câncer, ela participou de um teste clínico que oferecia 12 tratamentos de manutenção mensais de uma droga experimental, chamada Xyotax. Os resultados dos testes ainda não são conhecidos, mas o câncer de Platzer permaneceu em remissão. Todavia, Caryl Castleberry, de Glen Ellen, Califórnia, também paciente de câncer de ovário, recusou a terapia de manutenção. "Eu mal podia esperar para me ver livre do tratamento, então o ano a mais de tratamento que eles sugeriram simplesmente não era aceitável", disse Castleberry, 61 anos, cujo câncer permanece em remissão há seis anos. Robert L. Coleman, especialista em câncer de ovário do M.D. Anderson Cancer Center, em Houston, conta que, pelo fato de reincidências tenderem a serem fatais, tem havido um esforço urgente para prevenir ou atrasá-las. Porém, nos últimos anos, oito terapias de manutenção falharam em testes clínicos. Finalmente, um estudo publicado em 2003 mostrou que 12 tratamentos mensais de manutenção com paclitaxel, droga genérica cujo nome comercial é Taxol, atrasou a progressão de tumores em sete meses, em comparação com tratamentos de três meses com a mesma droga. No entanto, a diferença no índice de sobrevivência não foi significante estatisticamente, disse Coleman, então ainda há debates sobre os méritos da terapia de manutenção para o câncer de ovário. Para o câncer de pulmão, a adoção da terapia de manutenção está sendo encorajada pelos resultados de testes clínicos com a droga Alimta, apresentados no encontro de oncologia em Orlando, Flórida, em maio. Com base nesses testes, tanto a FDA (Food and Drug Administration) quanto agências de regulamentação europeias aprovaram o uso da Alimta para a terapia de manutenção, no começo do mês. Os testes, patrocinados pela Eli Lilly, fabricante da Alimta, envolveram 663 pacientes com câncer de ovário, cujos tumores diminuíram ou permaneceram estáveis após quatro ciclos habituais de quimioterapia inicial. Na prática comum, aqueles pacientes não seriam tratados novamente, a não ser que os tumores continuassem a crescer. Porém, nos testes, alguns pacientes receberam Alimta imediatamente após a finalização da quimioterapia inicial. Eles viveram uma média de 13,4 meses, significativamente mais tempo que os 10,6 meses para aqueles que receberam um placebo. Pacientes com o tipo de tumor no qual a Alimta trabalha melhor viveram uma média de 15,5 meses com a terapia de manutenção. "Isso muda o paradigma do tratamento", comenta Chandra P. Belani, vice-diretor da Penn State Hershey Cancer Institute e principal pesquisador dos testes. Entretanto, alguns céticos afirmam que os testes não compararam diretamente a administração imediata de Alimta com a espera até a piora do tumor. Então, não fica claro se foi apenas a droga que trouxe o benefício, em vez da terapia de manutenção. Dois terços dos pacientes no grupo do placebo receberam uma terapia adicional quando seus tumores pioraram, mas geralmente não com Alimta. Essa droga, também conhecida como pemetrexed, custa cerca de US$ 4 mil por infusão, e é administrada uma vez a cada três semanas. Com base em dados dos testes da Lilly, os pacientes que recebem a droga como terapia de manutenção receberiam uma média de três infusões a mais do que aqueles que recebem a droga como terapia adicional. Além disso, de 30 a 50% dos pacientes de câncer de pulmão nunca recebem uma terapia adicional, geralmente porque a condição deles piora bastante. Assim, se a Alimta fosse usada como terapia de manutenção, muito mais pacientes a receberiam. Para linfomas não-Hodgkin, a droga usada para o tratamento de manutenção é, geralmente, o Rituxan, ou rituximab, comercializada pela empresa Genentech and Biogen Idec. Testes clínicos mostraram que a terapia de manutenção com o Rituxan não ajudou pacientes com uma forma agressiva da doença. No entanto, um estudo separado, publicado recentemente no "The Journal of Clinical Oncology", mostrou que ela ajudava aqueles com formas menos agressivas da doença. Depois de três anos, o câncer não piorou em 68% das pessoas que receberam a terapia de manutenção. Isso ocorreu com apenas 33% dos pacientes que não receberam a terapia. A diferença no índice de sobrevivência foi menor, com 92% daqueles que receberam a terapia de manutenção vivos depois de três anos, em comparação a 86% daqueles que não receberam. "Precisamos de mais acompanhamento para ver se isso irá melhorar o índice geral de sobrevivência", afirma Thomas M. Habermann, da Mayo Clinic, um dos autores do estudo. Todavia, muitos médicos estão administrando tratamentos de manutenção em seus pacientes, geralmente quatro infusões semanais de Rituxan a cada seis meses, durante dois anos. Isso custaria cerca de US$ 30 mil por ano. Para mieloma múltiplo, a droga testada com mais freqüência para terapias de manutenção - Revlimid, ou lenalidomide - já está sendo usada por pacientes com reincidência. Ela custa mais de US$ 6 mil por mês e é tomada como uma única pílula diária, o que a torna particularmente conveniente para um uso prolongado. Agora, ela é usada por uma média de dez meses nos Estados Unidos; com terapias de manutenção que podem evoluir para anos, já que as remissões de mieloma múltiplo podem durar muito tempo. Os testes estão a caminho, mas alguns médicos não querem esperar. "Realmente, precisamos de alguns dados randômicos para apoiar nossa postura, mas, nesse meio tempo, parece uma boa ideia", atesta Brian G.M. Durie, presidente da International Myeloma Foundation, um grupo de defesa e pesquisa que recebe financiamento de empresas farmacêuticas. Kevin, estudante de graduação com mieloma múltiplo, espera que um transplante de células-tronco possa marcar o fim de seu tratamento. Assim, ele ficou surpreso quando seu médico sugeriu que ele tomasse Revlimid por dois anos como terapia de manutenção, como parte de testes clínicos. Ele toma a droga há um ano, com alguns leves efeitos colaterais, como fadiga e problemas digestivos. "Não fico entusiasmado em tomar uma droga como esta por tempo indeterminado", disse Kevin, que falou conosco sem revelar seu sobrenome, pois não quer que possíveis empregadores saibam sobre sua doença. "Mas, por outro lado, isso é muito melhor do que uma reincidência". Andrew Pollack - The New York Times

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