16 de ago. de 2010

A eterna Páscoa


A ETERNA PÁSCOA 
Do consumismo disseram que ele consagrava o instinto de propriedade levado ao extremo, a servidão dos homens às coisas. 


Ora, mais do que numa cultura do ter, vivemos na da circulação; os bens devem passar, sua destruição é planificada, sua obsolescência programada. Enquanto a possessão implica permanência, nossos objetos possuem apenas a sedução do efêmero, das séries curtas, eles passam de moda rapidamente, imediatamente suplantados por novos, que cintilam um instante antes de, por sua vez, desaparecer. 


Nós só os compramos para usá-los e comprar outros. A depreciação deve ser rápida, geral, pois nossa riqueza está ligada à dilapidação, não à conservação. No saque selvagem dos baderneiros, por ocasião das manifestações urbanas, no prazer que mostram em pilhar lojas, em incendiar automóveis, não devemos ver um profundo conformismo à lógica do sistema? O saque é uma homenagem involuntária à nossa sociedade, já que as mercadorias estão destinadas a ser suprimidas e substituídas. 


Os vândalos são consumidores apressados que queimam etapas e vão diretamente ao final do ciclo: a devastação. Nosso mundo é talvez materialista, mas à estranha maneira do desmentido, já que nos leva primeiro a nos desfazer do que nos pertence, a nos inebriar tanto com demolição quanto com aquisição dos objetos. Somente os restos duram realmente, prometidos a uma espécie de eternidade grotesca: dizem que a expectativa de vida de uma fralda de bebê seria 72 anos! 
Pascal Bruckner A tentação da inocência
imagem: sucata de brinquedos Vick Muniz

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