30 de nov. de 2012

Quando fores velha

Quando já fores velha, e grisalha, e com sono,
Pega este livro: junto ao fogo, a cabecear,
Lê com calma; e com os olhos de profundas sombras
Sonha, sonha com o teu antigo e suave olhar.

Muitos amaram-te horas de alegria e graça,
Com amor sincero ou falso amaram-te a beleza;
Só um, amando-te a alma peregrina em ti,
De teu rosto a mudar amou cada tristeza.

E curvando-te junto à grade incandescente,
Murmura com amargura como o amor fugiu
E caminhou montanha acima, a subir sempre,
E o rosto em multidão de estrelas encobriu.
William Yeats

Lindsay Lohan bebe dois litros de vodca por dia, diz site

A razão dos problemas de Lindsay Lohan, presa nesta quinta-feira após agredir uma mulher durante uma discussão em um bar em Nova York, parece ser um vício que vem se agravando nos últimos tempos: o consumo de álcool. Fontes ligadas à atriz disseram ao site TMZ que ela vem bebendo exageradamente há meses - algo como dois litros de vodca por dia.

O estresse provocado por outros escândalos e confusões em que esteve envolvida recentemente - em setembro, ela já havia sido detida por atropelar um pedestre e fugir, também em Nova York -, além de enfrentar uma situação financeira difícil, o que a levou até a deixar de pagar uma conta de hotel na Califórnia, estaria agravando o antigo vício, de acordo com o TMZ. Amigos contaram que, para se esquecer dos problemas legais e financeiros, ela começa a beber pela manhã e segue o ritmo até a noite - exatamente como aconteceu nesta quinta-feira, antes de ser presa.

As fontes ouvidas pelo TMZ disseram que os amigos da atriz desistiram de tentar ajudá-la pois, segundo eles, quando Lindsay está embriagada, torna-se muito violenta - o que, para o TMZ, fortalece a mais recente acusação de agressão contra ela.

A prisão aconteceu durante uma semana já difícil para Lindsay, cuja atuação mais recente, como a lenda do cinema Elizabeth Taylor no filme para TV Liz & Dick, foi mal recebida pela crítica. O canal de TV a cabo Lifetime informou, na segunda-feira, que apenas 3,5 milhões de norte-americanos assistiram ao filme, que estreou na semana passada.
TMZ

As 5 pedras no caminho da satisfação profissional

A trajetória rumo à satisfação profissional muita vezes encontra obstáculos. Toda carreira tem seus altos e baixos e mesmo o mais bem sucedido profissional já encontrou algumas pedras no caminho.

Não é difícil perceber quando o nível de motivação atinge patamares negativos. Com o ânimo em frangalhos para encarar o expediente no escritório, o profissional tende a mudar de emprego na primeira oportunidade. Esta realidade talvez explique a crescente rotatividade de profissionais nas empresas, o que no jargão corporativo é chamado de turnover.

“Apesar de se falar em apagão de talentos, o turnover tem aumentado. De modo, geral as pessoas não estão satisfeitas nos seus trabalhos”, diz Fausto Alvarez, sócio-diretor da consultoria Kienbaum.
Mas, afinal, o que está impedindo a felicidade dos profissionais? Exame.com consultou dois especialistas para tentar levantar quais as maiores pedras impedindo a estrada que leva à satisfação profissional. Confira quais são elas e o quanto de energia você vai ter que investir para tirá-las da rota:
1 Não gostar do que faz
Começar a manhã de trabalho no escritório contando as horas para o expediente acabar. Passar a semana inteira esperando o fim de semana chegar e ser tomado pelo incômodo frio na barriga assim que o sol se põe no domingo.
Identificar-se com este cenário pode ser um sinal de que você não experimenta satisfação alguma quando o assunto é trabalho. Na opinião de Pedro Gomes, representante da Dale Carnegie no Brasil, os mais frustrados são aqueles profissionais que não fazem o que gostam. 
“A satisfação está ligada ao objetivo de vida, então a primeira barreira é estar trabalhando na área que não é a paixão dela”, diz Gomes.
Como tirar esta pedra do seu caminho
Busque alternativas Esqueça mitos sobre transição de carreira e considere uma mudança. “Nunca é tarde para buscar o que gosta, temos pessoas terem sucesso aos 60 anos”, diz Gomes. Mas, lembre-se: investigue motivos e aposte no planejamento, etapas fundamentais para uma transição profissional menos turbulenta.
2 Falta de oportunidade e reconhecimento
Dos cerca de 20 mil executivos avaliados pela Kienbaum, diz Alvarez, o ponto central da insatisfação está relacionado à falta de oportunidade de crescimento profissional. 
“A gente pergunta para ele o que eles querem em troca para continuar na empresa em que estão trabalhando e o progresso de carreira é a questão que mais aparece”, explica o sócio diretor da Kienbaum.
Sem oferecer oportunidade de crescimento e com poucas chances de aprendizado, é difícil manter alguém satisfeito. Isso faz parte do reconhecimento que o profissional espera em contrapartida ao seu bom desempenho.
 “Tem empresa que acha que pagar um salário competitivo é o suficiente, mas uma boa remuneração não motiva, a falta de salário justo é que é altamente desmotivante”, diz Gomes.
“As pessoas já entenderam que salário maior é consequência de um desafio , de uma nova promoção, ninguém vai ganhar aumento se continuar fazendo a mesma coisa”, diz Alvarez.
Como tirar esta pedra do seu caminho
Não ter mais como se desenvolver na empresa pode ser um sinal de que o ciclo nela talvez já esteja fechado. No entanto verifique qual o seu grau de responsabilidade nesta situação.
Se decidir buscar novos desafios procure sempre optar por empresas que ofereçam oportunidades de crescimento e faça escolhas mais alicerçadas para que as chances de sucesso e permanência sejam maiores. Não se esqueça de que uma movimentação intensa de uma empresa para outra pode gerar desconfiança no mercado.
3 Falta de autonomia
Um gestor centralizador pode aniquilar a autonomia e tirar a motivação de sua equipe. “É uma questão que aparece bastante, os executivos querem ter mais autonomia em seus trabalhos”, diz Alvarez. 
De acordo com ele, esta pode ser uma “pedra” resultante da própria cultura da empresa. “A maioria, 80%, quer sair da empresa por causa do chefe por isso, na maioria das vezes o problema é está na liderança”, diz o especialista.
Uma pesquisa feita nos Estados Unidos revelou que um bom chefe vale mais que um aumento de salário. Isso porque a maioria das pessoas considera que um bom relacionamento com a chefia traria mais oportunidades de sucesso na carreira. 
Como tirar esta pedra do seu caminho
Se a questão da autonomia está atrapalhando a sua satisfação pessoal, uma alternativa é tentar negociá-la com seu chefe. Aposte em uma estratégia de negociação, e mostre que os resultados entregues por você referendam esse pedido. Lembre-se de que se o problema estiver ancorado na cultura da empresa, a dificuldade será maior.
4 Desequilíbrio entre a vida pessoal e profissional
Expediente eterno, horas extras no home office e trabalho acumulado no fim de semana pesam na balança e desequilibram a vida de muita gente.
Se a sua rotina é parecida com a de Joe Labor, personagem principal criado por André Caldeira no livro “Muito Trabalho Pouco Stress”, a sua satisfação deve mesmo estar próxima de zero.
“As pessoal reclamam muito disso. Empresas são máquinas de triturar as pessoas. Não tem diferença mais entre o ‘importante’ e o ‘urgente’”, diz Alvarez.
Como tirar esta pedra do seu caminho
A boa notícia é que a preocupação com a qualidade de vida está mais presente nas empresas. “Isso está mais na mesa dos executivos, hoje em dia”, diz Alvarez. 
Mas se esse cuidado está passando longe da sua empresa, cabe a você estabelecer alguns limites e investir na administração de tempo. Afinal não é preciso ser um workaholic para ter sucesso na carreira. 
5 Não saber lidar com o stress da rotina corporativa
Prazos, metas, resultados. Estas três palavras são também frutos da competitividade acirrada no mundo corporativo e podem assombrar muita gente. 
Se a pessoa não tiver capacidade para gerenciar isso, e principalmente, não saber lidar com a competitividade interna nas empresas, a satisfação pode ser prejudicada, diz representante da Dale Carnegie, Pedro Gomes.
Como tirar esta pedra do seu caminho
A competitividade é fato e não vai deixar de existir. Ao contrário a tendência é sempre aumentar. Por isso desenvolva mecanismos que o ajudem a gerenciá-la. “O gerenciamento do estresse tem que fazer parte da competência do profissional”, diz Gomes.
Se você está sentindo dentro de uma panela de pressão, algumas atitudes são fundamentais. Ser transparente, negociar prazos, definir prioridades e desligar-se quando possível são algumas delas.
Camila Pati -  Revista Exame

29 de nov. de 2012

Babbo, 21/12/1936 – ET/ER/NO


Nunca falei com meu pai a respeito depois que o Palmeiras foi rebaixado. Sei que ele soube. Ou imaginou. Só sei que no primeiro domingo depois da queda para a Segunda pela segunda vez, seu Joelmir teve um derrame antes de ver a primeira partida depois do rebaixamento. Ele passou pela tomografia logo pela manhã. Em minutos o médico (corintianíssimo) disse que outro gigante não conseguiria se reerguer mais.
No dia do retorno à segundona dos infernos meu pai começou a ir para o céu. As chances de recuperação de uma doença autoimune já não eram boas. Ficaram quase impossíveis com o que sangrou o cérebro privilegiado. Irrigado e arejado como poucos dos muitos que o conhecem e o reconhecem. Amado e querido pelos não poucos que tiveram o privilégio de conhecê-lo.
Meu pai.
O melhor pai que um jornalista pode ser. O melhor jornalista que um filho pode ter como pai.
Preciso dizer algo mais para o melhor Babbo do mundo que virou o melhor Nonno do Universo?
Preciso. Mas não sei. Normalmente ele sabia tudo. Quando não sabia, inventava com a mesma categoria com que falava sobre o que sabia. Todo pai é assim para o filho. Mas um filho de jornalista que também é jornalista fica ainda mais órfão. Nunca vi meu pai como um super-herói. Apenas como um humano super. Só que jamais imaginei que ele pudesse ficar doente e fraco de carne. Nunca admiti que nós pudéssemos perder quem só nos fez ganhar.
Por isso sempre acreditei no meu pai e no time dele. O nosso.
Ele me ensinou tantas coisas que eu não sei. Uma que ficou é que nem todas as palavras precisam ser ditas. Devem ser apenas pensadas. Quem fala o que pensa não pensa no que fala. Quem sente o que fala nem precisa dizer.
Mas hoje eu preciso agradecer pelos meus 46 anos. Pelos 49 de amor da minha mãe. Pelos 75 dele.
Mais que tudo, pelo carinho das pessoas que o conhecem – logo gostam dele. Especialmente pelas pessoas que não o conhecem – e algumas choraram como se fosse um velho amigo.
Uma coisa aprendi com você, Babbo. Antes de ser um grande jornalista é preciso ser uma grande pessoa. Com ele aprendi que não tenho de trabalhar para ser um grande profissional. Preciso tentar ser uma grande pessoa. Como você fez as duas coisas.
Desculpem, mas não vou chorar. Choro por tudo. Por isso choro sempre pela família, Palmeiras, amores, dores, cores, canções.
Mas não vou chorar por algo mais que tudo que existe no meu mundo que são meus pais. Meus pais (que também deveriam se chamar minhas mães) sempre foram presentes. Um regalo divino. Meu pai nunca me faltou mesmo ausente de tanto que trabalhou. Ele nunca me falta por que teve a mulher maravilhosa que é dona Lucila. Segundo seu Joelmir, a segunda maior coisa da vida dele. Que a primeira sempre foi o amor que ele sentiu por ela desde 1960. Quando se conheceram na rádio 9 de julho. Onde fizeram família. Meu irmão e eu. Filhos do rádio.
Filhos de um jornalista econômico pioneiro e respeitado, de um âncora de TV reconhecido e inovador, de um mestre de comunicação brilhante e trabalhador.
Meu pai.
Eu sempre soube que jamais seria no ofício algo nem perto do que ele foi. Por que raros foram tão bons na área dele. Raríssimos foram tão bons pais como ele. Rarésimos foram tão bons maridos. Rarissíssimos foram tão boas pessoas. E não existe outra palavra inventada para falar quão raro e caro palmeirense ele foi.
(Mas sempre é bom lembrar que palmeirenses não se comparam. Não são mais. Não são menos. São Palmeiras. Basta).
Como ele um dia disse no anúncio da nova arena, em 2007, como esteve escrito no vestiário do Palmeiras no Palestra, de 2008 até a reforma: “Explicar a emoção de ser palmeirense, a um palmeirense, é totalmente desnecessário. E a quem não é palmeirense… É simplesmente impossível!”.
A ausência dele não tem nome. Mas a presença dele ilumina de um modo que eu jamais vou saber descrever. Como jamais saberei escrever o que ele é. Como todo pai de toda pessoa. Mais ainda quando é um pai que sabia em 40 segundos descrever o que era o Brasil. E quase sempre conseguia. Não vou ficar mais 40 frases tentando descrever o que pude sentir por 46 anos.
Explicar quem é Joelmir Beting é desnecessário. Explicar o que é meu pai não estar mais neste mundo é impossível.
Nonno, obrigado por amar a Nonna. Nonna, obrigado por amar o Nonno.
Os filhos desse amor jamais serão órfãos.
Como oficialmente eu soube agora, 1h15 desta quinta-feira, 29 de novembro. 32 anos e uma semana depois da morte de meu Nonno, pai da minha guerreira Lucila.
Joelmir José Beting foi encontrar o Pai da Bola Waldemar Fiume nesta quinta-feira, 0h55.
Mauro Beting

28 de nov. de 2012

Valores pessoais


Os valores que em verdade possuímos, não são necessários exibi-los: eles se evidenciam por si sós.
Carlos Bernardo González Pecotche

A semente


“E, quando semeias, não semeias o corpo que há de nascer, mas o simples grão de trigo ou de outra qual-quer semente.” Paulo. (1ª Epístola aos Coríntios, 15:37.)

Nos serviços da Natureza, a semente reveste-se, aos nossos olhos, do sagrado papel de sacerdotisa do Criador e da Vida.

Gloriosa herdeira do poder divino, coopera na evolução do mundo e transmite silenciosa e sublime lição, tocada de valores infinitos, à criatura.

Exemplifica sabiamente a necessidade dos pontos de partida, as requisições justas de trabalho, os lugares próprios, os tempos adequados.

Há homens inquietos e insaciados que ainda não conseguiram compreendê-la. Exigem as grandes obras de um dia para outro, impõem medidas tirânicas pela força das ordenações ou das armas ou pretendem trair as leis profundas da Natureza; aceleram os processos da ambição, estabelecem domínio transitório, alardeiam mentirosas conquistas, incham-se e caem, sem nenhuma edificação santificadora para si ou para outrem.

Não souberam aprender com a semente minúscula que lhes dá trigo ao pão de cada dia e lhes garante a vida, em todas as regi-ões de luta planetária.

Saber começar constitui serviço muito importante.

No esforço redentor, é indispensável que não se percam de vista as possibilidades pequeninas: um gesto, uma palestra, uma hora, uma frase pode representar sementes gloriosas para edifi-cações imortais. Imprescindível, pois, jamais desprezá-las.
Francisco Cândido Xavier

27 de nov. de 2012

Nove meses depois ...


Jack decidiu esquiar com o amigo Bob.

Então eles colocaram tudo na minivan e seguiram para o norte.

Após dirigir por algumas horas, foram pegos por uma terrível tempestade..

Pararam numa fazenda próxima e perguntaram a uma mulher atraente que atendeu a porta, se poderiam passar a noite lá.

Eu compreendo que o tempo esteja pavoroso, eu vivo nessa enorme casa, sozinha, mas como fiquei viúva recentemente, ela explicou, tenho medo do que os vizinhos vão falar se os deixar ficarem aqui.

Não se preocupe, disse Jack.  Ficaremos bem se pudermos dormir no celeiro, e assim que o tempo amainar,  iremos embora de manhã bem cedo. A mulher concordou e os dois homens foram para o celeiro passar a noite.

Amanheceu, o tempo clareou, e eles seguiram caminho.
Aproveitaram um bom fim de semana, esquiando.
Mais ou menos nove meses depois, Jack recebeu uma inesperada carta de um advogado.

Demorou um tempo até que ele compreendesse que era o advogado da bela viúva que tinha conhecido no fim de semana em que foram esquiar.
Ele chegou para o amigo Bob e perguntou:  

Bob, você lembra daquela mulher bonita, viúva, da fazenda onde ficamos naquele fim de semana, nove meses atrás?

Lembro sim, disse Bob.

Por acaso, você, hum, foi visitá-la naquela noite?
Bem, ham... fui! Bob respondeu envergonhado por ter sido descoberto, devo admitir que fui!

E, por acaso, você deu meu nome ao invés de dizer o seu? 
O rosto de Bob ficou vermelho que nem beterraba e ele falou:

Olha,  pera aí, desculpa amigão, acho que fiz isso mesmo.

Por que você pergunta?

Porque ela morreu e deixou tudo prá mim.
Pensou que o final seria diferente?

Uma insidiosa traição


A recente Operação Porto Seguro, deflagrada pela Polícia Federal, reclama do mundo político  maior cuidado na nomeação para os cargos de confiança. 
Há o encadeamento nos atos de corrupção: o indicado por alguém em situação elevada se sente portador do prestígio de quem o apadrinhou. Nomeado, passa a indicar outros, para posições em que pode influir.
Foi dessa forma, ao que revelam as informações, que agiu a senhora Rosemary Nóvoa de Noronha, escudada na circunstância de haver sido secretária de Lula e ocupar a chefia do gabinete da Presidência em São Paulo. Pediu e obteve a nomeação de seus dois irmãos, do marido e da filha para cargos importantes em duas agências reguladoras e na Infraero. 
O mesmo raciocínio pode ser aplicado no caso do advogado geral da União, que ignorou o currículo de José Weber Holanda Alves e o fez seu segundo. Pouco importa se os nomeados sejam estranhos ao serviço público ou funcionários de carreira. Os cargos de chefia — como os de diretores das agências reguladoras e de adjuntos do advogado geral da União —, bem como os de assessoria direta dos que tomam decisões só podem ser preenchidos por pessoas que atendam aos requisitos de comprovada idoneidade moral e de confirmada competência técnica.
É de se esperar que o irmão de Rosemary, que ocupa a diretoria de hidrologia da ANA, saiba mais de água do que a conhecida fórmula de H20, mas seria interessante descobrir onde estudou hidrologia, engenharia hidráulica, ou que experiência tem do assunto, por ter trabalhado no ramo. E o que ocupa uma das diretorias da Anac saiba mais de aviação do que escolher, pela internet, o voo  conveniente. O mesmo se espera do amparado cônjuge de Rosemary, que ajuda a administrar os aeroportos brasileiros.
A lisura no serviço público não é só uma exigência da ética elementar. É uma necessidade política do Estado. A probidade nas decisões de governo é a mais poderosa forma de eficiência. Os empresários honrados que negociam com o governo são muitas vezes compelidos a curvar-se à concussão, pelo simples fato de que os seus concorrentes o fazem. Foi o que confessou Antonio Ermírio de Moraes, quando o seu nome surgiu como tendo sido achacado por Paulo César Farias, o hábil arrecadador de recursos de há 20 anos. Quando o dono da Delta é gravado, em conversa com Carlos Cachoeira, explicando que compra políticos com milhões de reais, seus concorrentes entram no esquema, ou mudam de negócio.
A propósito, é de se lembrar a desculpa de PC Farias, ao ser ouvido pela CPMI que o investigava, a de que seu comportamento fazia parte da cultura brasileira. A corrupção é um crime universal e de todos os tempos, mas não se trata de cultura de qualquer povo em especial. Os escândalos frequentes nos Estados Unidos, na Inglaterra, na França e na Espanha não podem ser debitados a uma cultura europeia que nos deu alguns dos maiores pensadores e poetas da História — como Cervantes e Shakespeare; Diderot e Emerson.
As falcatruas podem fazer parte da cultura de uma ínfima minoria de brasileiros, como de uma ínfima minoria de espanhóis, mas não da cultura nacional da Espanha, nem do Brasil.   Os brasileiros que se levantam pela manhã e trabalham honradamente o dia inteiro são mais de noventa e nove por cento da população — disso não há dúvida.
A corrupção é a mais danosa das formas criminais, porque ela, além de subtrair recursos públicos, que devem ser usados para o benefício comum, contribui para o descrédito das instituições políticas e compromete a reputação nacional no exterior. Trata-se de um crime de traição ao país e ao seu povo.
É tempo de a cidadania mobilizar-se, não contra esse ou aquele partido, contra essa ou aquela doutrina ou ideologia política, mas no esforço de escoimar, do serviço público, os que não o exercem com dedicação e lisura. A administração federal e dos estados se faz com a imensa maioria de pessoas honradas e dedicadas. Tal como na sociedade nacional, de que são parcela, os corruptíveis são ínfima minoria no serviço público, que pode ser facilmente identificada e descartada.            
Há que se registrar, no entanto, que nem todos os corruptos e corruptores são incompetentes: o governo que sucedeu ao de Itamar Franco, em tudo e por tudo sua antítese, notabilizou-se pelos títulos acadêmicos de seus pró-homens — e pelos escândalos, até agora sepultados nas gavetas da Procuradoria Geral da República. Um só desses escândalos, o do Banestado, custou ao país, segundo as estimativas da imprensa, mais de 30 bilhões de dólares, transferidos aos paraísos fiscais. Seria bom que fossem exumados, mesmo que os culpados possam estar imunes ao castigo penal, pela prescrição. A nação tem o direito de saber quem é quem e de tentar reaver os dinheiros desviados.
Mauro Santayana


Maneiras de acessar a espiritualidade

Nos últimos 30, 40 anos, uma sede de espiritualidade se instalou no planeta, fazendo com que muitos ateus convictos voltassem a suas religiões de origem ou fossem buscar em formas religiosas alternativas respostas a suas inquietações interiores. 

 Contrariando Freud, que encarava a espiritualidade como um sintoma de imaturidade psíquica, pesquisadores respeitáveis, como o psiquiatra tcheco Stanislav Grof, garantem ser a dimensão espiritual uma instância fundamental da psique.


Negá-la nos tornaria irreparavelmente mutilados.Segundo o médico Claudio Lottenberg, presidente do Hospital Israelita Albert Einstein, de São Paulo, 96% dos americanos acreditam em Deus e 90% rezam sistematicamente. “Os que rezam fazem também por acreditar que suas preces têm um impacto sobre a saúde. Creio que esses dados podem ser estendidos ao Brasil”, afirma o médico.Mas, independentemente do motivo que a desencadeou, uma característica dessa nova espiritualidade é seu caráter ecumênico, menos preocupado em seguir o figurino de uma religião do que em combinar diferentes tradições. “Eu chamo essa tendência de bricolagem ou patchwork espiritual”, diz o pesquisador Frank Usarski, professor do programa de pós-graduação em ciência da religião da PUC de São Paulo.

“Ela leva em conta a liberdade do indivíduo na busca de seu caminho espiritual e está ligada à crise das instituições religiosas tradicionais. Explico: ioga, meditação, tarô, I Ching, carma, reincarnação etc. são práticas e conceitos cada vez mais usados de maneira isolada, sem nenhuma referência ao contexto histórico e sistemático em que originalmente surgiram.”É claro que essa tendência apresenta o risco da superficialidade, mas possui também um aspecto positivo, fazendo de cada um o sujeito de suas próprias escolhas.

Toda religião genuína nos traz uma parcela da verdade, adaptada ao tempo, ao lugar e às pessoas para as quais foi destinada. Por isso, as diferentes religiões não são excludentes, mas complementares. Jalal ud-Din Rumi (1207-1273), um grande místico e poeta sufi, declarou que existem tantos caminhos quanto caminhantes. Cabe ao indivíduo empreender sua própria viagem. Ligando o som para a música tocar sua alma, ficando quieto para ouvir o que há de mais profundo, observando a natureza ou indo para Santiago de Compostela.

No contraponto do som, a ausência deste também leva à abertura espiritual. A recitação musical dos sufis muçulmanos culmina no silêncio. A cabala judaica ensina que mais poderosa do que a prece pronunciada (constituída de sons articulados) e a prece mental (formada de pensamentos conscientes) é a prece silenciosa, realizada com a completa entrega ao divino. Por meio do silêncio, o praticante alcança um estado de consciência superior ao da fala e ao do pensamento.

Silencia para que algo maior se expresse. É a esse estado superior de consciência que alude o Salmo quando diz: “Aquietaivos e sabei que eu sou Deus”. 

Na Índia, esse silêncio verbal e mental é chamado de Mauna Yoga. Sri Aurobindo Ghose (1872-1950), um dos maiores iogues da era contemporânea, explica o poder de tal prática: “Quando o mental mergulha no silêncio é que, mais freqüentemente, se produz a completa descida de uma vasta paz, vinda do alto. 


E, nessa vasta tranqüilidade, dá-se a realização do Eu silencioso, situado acima do mental”. Presentes em todas as religiões, eles são veículos que conduzem a Deus. A espiritualidade cristã afirma que, “no princípio, era o Verbo”, a palavra criadora de Deus. Também na espiritualidade indiana, o Aum ou Om, o Som Primordial, é considerado a primeira manifestação do divino. 


Não se trata, é claro, do som articulado e audível, que necessita de um meio material para se propagar. Esse é apenas o quarto e último estágio do som. Aum ou Om é o primeiro. Não é a voz de Deus, mas a própria divindade em vibração.Pela repetição dessa sílaba, o iogue sintoniza sua consciência com o divino. Por isso, quase todos os mantras começam com Aum ou Om. O emprego do som como um veículo para estados superiores de consciência está presente em todas as tradições espirituais autênticas. O xamã antigo tinha suas canções de poder, recebidas do plano espiritual ou transmitidas pelos sons da natureza (o pio da coruja, o farfalhar do pinheiro etc.). 


No candomblé afro brasileiro  cada orixá é convidado a descer ao terreiro com um toque específico do atabaque. O emprego do som como um veículo para estados superiores de consciência está presente em todas as tradições espirituais autênticas. O xamã antigo tinha suas canções de poder, recebidas do plano espiritual ou transmitidas pelos sons da natureza (o pio da coruja, o farfalhar do pinheiro etc.). No candomblé afro-brasileiro  cada orixá é convidado a descer ao terreiro com um toque específico do atabaque. 


E os padres do monte Atos, na Grécia, até hoje alcançam o transe místico sincronizando a recitação da frase Kyrie eleison (“Senhor, tende misericórdia”) com o ritmo respiratório. Procedimento semelhante é adotado por cabalistas judeus e sufis muçulmanos. Recuperando sua força original, que nossa ruidosa civilização esqueceu, a palavra evoca (lembra) e invoca (chama) a presença divina. “Conhece-te a ti mesmo e conhecerás os mundos e os deuses.” E ssa frase foi escrita na porta do Oráculo de Delfos, na antiga Grécia. Cada vez mais parte da vida, não estranha que o tema espiritualidade esteja presente no espaço terapêutico. Podemos começar uma sessão tristes, angustiados com problemas de relacionamento – em casa ou no trabalho – e sair com algo além de alento. Além de reflexão também. 


“As diferentes terapias têm como objetivo colocar o indivíduo em contato consigo mesmo. Se a essência de todo ser humano é o Espírito, então, qualquer terapia que realmente se aprofunde tende a ultrapassar as camadas superficiais da psique, palcos de conflitos secundários, e levar a pessoa ao encontro de sua dimensão espiritual”, diz a terapeuta corporal Márcia Micheli, que coordena grupos de respiração holotrópica, técnica desenvolvida pelo psiquiatra tcheco Stanislav Grof e sua esposa, Christina. O que a terapeuta nos recorda é que somos uma totalidade integrada, e não um conjunto de compartimentos estanques, como o dia-adia nos faz acreditar. Mesmo procedimentos que não tenham tal intenção podem constituir canais para a abertura espiritual. As peregrinações em busca de um sentido.As peregrinações aos lugares sagrados são um dos fenômenos espirituais mais impressionantes. Porém, mais importante do que chegar é ir. 


E, não raro, a transformação que busca alcançar no santuário, o peregrino a obtém no próprio esforço por atingi-lo. A viagem exterior é apenas o símbolo de uma viagem interior.O mérito da jornada é trazer à tona qualidades como a aspiração espiritual, a concentração no objetivo a atingir e a entrega ao Divino, que normalmente permanecem soterradas pelos milhares de afazeres e distrações da vida cotidiana. Mas não é necessário ir a Santiago de Compostela, Meca ou Varanasi para que uma viagem acalente o coração. A boa viagem aguça as sensações, alarga os sentimentos, depura os pensamentos e abre as portas para a intuição, facilitando o encontro com a pessoa certa, que pode ser um guru a seu modo, ou a obtenção da resposta para aquela pergunta que sempre nos fizemos.Embora nem sempre seja fácil, deveríamos aprender a cultivar essas mesmas qualidades aqui e agora: na casa, na rua, no ambiente de trabalho. 


E, com a atenção focada em nosso santuário interior, fazer de cada dia uma peregrinação. Há muitas formas de se encontrar consigo mesmo.Você pode sentar ou ficar em pé, aquietar-se numa postura confortável ou caminhar, fechar os olhos ou mantê-los abertos, isolar-se ou se dedicar a uma atividade prática, se manter em silêncio ou repetir uma frase sagrada. Com certa prática, você conseguirá meditar até enquanto aguarda sua vez numa sala de espera, realiza um trabalho doméstico e dirige seu carro. Em todas essas situações, acontece algo fundamental: a meditação adaptada a seu temperamento e momento de vida. Mas como saber se estamos realmente meditando? Talvez possamos aprender algo com as palavras de um mestre consumado da meditação, Sri Ramakrishna Parama hansa (1836-1886), considerado um dos maiores santos da Índia contemporânea: “Para meditar, deves recolher-te dentro de ti mesmo (...) e discernir sempre entre o Real e o irreal. Só Deus é Real, a Eterna Substância. Tudo mais é irreal, quer dizer, impermanente. 


Discernindo assim, deves afastar da mente as coisas impermanentes”. A conexão entre o corpo e a alma fica ainda mais forte com a ajuda das práticas físicas. O que a ioga, o tai chi chuan e o kum nye tibetano têm em comum? “Os exercícios físicos proporcionam a força necessária para agüentar a abertura espiritual. É como se você reforçasse o filamento da lâmpada, capacitando-o a suportar uma carga elétrica maior”, compara a professora de ioga Sharana Devi, uma das representantes da kriya-ioga, de Babaji, no Brasil. “Outro benefício dos exercícios”, prossegue Sharana, “é equilibrar a polaridade existente em nosso interior, o yang e o yin, o masculino e o feminino, o assertivo e o receptivo. A contradição entre essas tendências é responsável por grande parte das turbulências da mente. 


Equilibrando os opostos, os exercícios promovem o relaxamento e o silêncio interior necessários à experiência meditativa.” Assim como a alimentação correta, o contato com a natureza e o repouso apropriado, os exercícios nos ajudam a equilibrar os gunas, os três princípios que, segundo a antiga sabedoria indiana, regem todos os entes e fenômenos do mundo: a imobilidade (tamas), o movimento (rajas) e a sublimação (sattva). Com uma vida saudável, evitamos o predomínio excessivo de qualquer um desses princípios. Nem letárgicos (tamásicos), nem agitados (rajássicos), nem excessivamente etéreos (sattívicos), encontramos o ponto certo de equilíbrio físico, mental e espiritual.
José Tadeu Arantes

25 de nov. de 2012

Confissões de terceiro grau

Os naves. Joaquim e Sebastião só não contaram onde estava o dinheiro roubado: não havia - Fotos: reprodução

Defesa do goleiro Bruno teria cogitado até evocar o caso dos irmãos Naves, réus confessos (na porrada) de um crime inexistente


Tudo depende de que lado se está. Do lado da acusação, Eliza foi abatida, esquartejada, incinerada, suas cinzas jogadas numa lagoa e sua mão intacta atirada aos pitbulls. 

Do lado da defesa, ela arrumou um passaporte falso por R$ 4 mil, amoitou-se na Bolívia por um tempo, atravessou o mar até o Leste Europeu e vendeu seu corpo voluptuoso para produtores de filmes pornô, a fim de fazer um pé-de-meia e voltar ao Brasil. Porque, na ausência de um cadáver, parece que é assim que funciona: ou o crime ganha ainda mais crueldade ou vira roteiro de realismo fantástico.

Tudo depende também de provas. No caso Bruno, há indícios fortes e testemunhos consistentes que levaram o caso a júri popular. A defesa, por seu turno, atira garrafas d'água no chão, diz que aquilo não passa de papelada e faz malabarismos jurídicos - tanto que conseguiu desmembrar o processo e jogou o veredicto do ex-goleiro do Flamengo e da ex-mulher dele para março. À boca pequena, ainda disse que usaria em plenário o caso dos irmãos Naves, se preciso fosse. Se preciso for, que conte a história de fio a pavio, pede a família Naves.

O mais tenebroso erro judicial do Brasil começou na madrugada de 29 para 30 de novembro de 1937, quando Benedito Pereira Caetano desapareceu de Araguari, então Araguary. O comerciante de arroz se escafedeu no Triângulo Mineiro sem deixar vestígio. Sebastião José Naves, de 35 anos, e Joaquim Rosa Naves, de 30, não tardaram a dar queixa na delegacia. Primeiro porque eram primos de Benedito. Segundo porque o desaparecido, até o dia anterior, estava hospedado na casa de Joaquim. Terceiro porque Benedito e Joaquim compraram juntos um caminhão Ford para transportar cereais até Uberlândia. Quarto porque também deu chá de sumiço a quantia de 90 contos de réis, resultado de uma venda gorda de sacas de arroz. Tinha algo de errado no horizonte, e a polícia havia de averiguar isso.

Acontece que, pouco tempo depois, o delegado civil é substituído por um tenente da força pública do Estado Novo, Francisco Vieira dos Santos, o Chico Vieira. Afeito à tortura, ele rapidamente deu força ao hábito. Chico Vieira acorrentou, espancou, atirou na perna, fez engolir caco de vidro, pendurou de ponta-cabeça, jogou balde de água fria, isolou em cela escura, lambuzou de mel e ofereceu às abelhas seus suspeitos número 1 - os próprios irmãos Naves. Não adiantou Zé Prontidão, amigo da família, dizer que tinha visto Benedito tal e qual pras bandas de Uberlândia, com uma mala na mão. Sobrou safanão para ele também, que, abobalhado, retirou o depoimento.

Irritado com a teimosia dos capiaus na própria inocência, o tenente alongou seu chicote. Ana Rosa, chamada de Don'Ana pela comunidade e Sá Rosa pelos seus, sentiu a tortura chinesa da gota d'água e foi seviciada na cadeia, na frente dos filhos. As mulheres de Joaquim e Sebastião, Antônia e Salvina, também foram presas e ameaçadas de morte. Ilson, bebê de colo de Salvina, morreu por falta de leite materno. Um cunhado de Sebastião tomou um "telefone" nos ouvidos que o deixou sem rumo... Os Naves, enfim, trincaram. Primeiro Joaquim, depois Sebastião. "Sim, fomos nós", assinaram em depoimento, sem defesa nem proteção.

O brainstorming do crime seria o seguinte. Na madrugada do dia 30, os irmãos, mais Benedito, teriam ido de caminhão até a Ponte do Pau Furado. Ali Joaquim, com a ajuda de Sebastião, enforcara o primo com uma corda de bacalhau e ambos atiraram o corpo no Rio das Velhas. Antes sacaram de Benedito um pano que estava amarrado por dentro do cueca com os 90 mil réis embaladinhos, que colocaram numa lata de soda e enterraram no meio do mato, entre duas árvores. Em hora oportuna, voltariam lá pra buscar o lucro da covardia.

O único furo do esquema era justamente o dinheiro. Na frente de testemunhas, Joaquim cavou formigueiros e buracos de tatu, em vão. Ainda assim, e apesar de dois habeas corpus constituídos pelo advogado João Alamy Filho, que abraçou a causa e o causo, os dois continuaram presos, indo a júri popular por duas vezes. O placar foi largo a favor dos Naves - 6 a 1 na primeira rodada, 6 a 1 na segunda. O povo intuía que aquilo era armação do poder. Mas na ditadura não cabia a soberania do júri, e o Tribunal de Justiça inverte o resultado para uma pena de 25 anos e meio a serem cumpridos na penitenciária agrícola de Ribeirão das Neves, sob o argumento de que "dificilmente se faria tão plena prova de latrocínio".

Revista, a condenação caiu para 16 anos e, com 8 deles nas costas, os irmãos ganharam a condicional. Em agosto de 1948, Joaquim Rosa Naves morre de doença contraída na tortura. Três meses antes, o tenente Chico Vieira tem um AVC fatal em Belo Horizonte, onde fora laureado por ter elucidado o crime.

Então, de uma hora para outra, em julho de 1952, Benedito reaparece no Triângulo Mineiro. Estava numa fazenda do pai, em Nova Ponte, perto de Araguari. "Custou convencer o juiz que o morto tinha aparecido", diz Ivaldo Vicente Naves, o caçula de Sebastião, contando como foi difícil o pai conseguir força policial para confirmar o boato da ressurreição. Ivaldo tinha 8 anos e lembra que foi à cadeia conferir de perto o peste que não chama assim. Benedito ficou nove dias preso por apropriação indébita dos 90 contos. Tinha corrido mundo, batido cabeça aqui e ali, comprado uma fazenda na Bolívia (sempre a Bolívia). Jurava de pé junto, pela sagrada vida dos filhos, que não sabia da agonia dos Naves até então. Poucos dias depois, sua família inteira - mulher e três herdeiros -, que viajava de Jataí (GO) para Araguari para prestar esclarecimentos sobre o caso, morreu num acidente de avião.

Se é para lembrar de sequelas da tortura, Ivaldo resgata a dentadura precoce do pai. Todos os dentes dele foram arrancados a seco, de alicate, pelos soldados do tenente. Mas Sebastião dizia que era para olhar pra frente, que o passado a Deus pertencia. Ivaldo trabalhou como contínuo no escritório do dr. Alamy, virou advogado para entender de direito e hoje é dono de uma empresa que cuida da segurança e custódia de valores. O pai conseguiu uma indenização do Estado, estampada nos jornais sob o título "A Justiça cobrou mais e pagou menos". Voluntário vicentino de carteirinha, Sebastião trabalhou no presídio em Ribeirão das Neves e faleceu de ataque cardíaco aos 62 anos.

Já Benedito morreria dali a três anos, em 1967, livre de pena, na cidade de Jataí. Foi o mesmo ano de lançamento de O Caso dos Irmãos Naves, de Luiz Sérgio Person, baseado no livro homônimo do advogado de defesa João Alamy Filho. Anselmo Duarte, no que considerava seu melhor papel no cinema, fazia um empertigado Chico Vieira, que aparava as unhas com um cortador enquanto sentenciava os irmãos a mais pancadaria. Raul Cortez encarnou o Joaquim/Quinca e Juca de Oliveira assumiu Sebastião. "Essa história reflete a psicopatia de um tenente", diz Juca, que durante três meses conviveu dia e noite com a população de Araguari. O filme foi visto como um "corajoso grito antitortura", já que denunciava o autoritarismo de outrora estando mergulhado em um.

Ontem, em Araguari, o II Encontro Nacional da Família Naves também propunha reavivar o caso em seus 75 anos. A ideia era destacá-lo como símbolo de luta pelos direitos humanos e contra a violência policial, que grassa por tudo que é Brasil. Jales, mentor do encontro e que contabiliza uns 60 mil Naves no País - 60.001 com ele -, disse do prazer de juntar todo esse povo nascido a partir do português João de Almeida Naves, que chegou há 362 anos. Especialmente porque, como agora explica a historiadora Maria Helena Fernandes Cardoso, cujo Naves caiu por alguma arbitrariedade do cartório, muitos eram consanguíneos, primo com prima, tio com sobrinha, tia com sobrinho, especialmente até a sétima geração, na qual estariam Sebastião e Joaquim.

Don'Ana não fugiu à regra e casou com um primo-irmão aos 13 anos. Viúva aos 39, prezou pela honradez dos 14 filhos e viveu pela soltura dos dois injustiçados. Por isso recebeu da primeira-dama Sarah Kubitschek, em 1958, um colar de pérolas e o diploma de mãe do ano. Destaque na edição latino-americana da Time daquele ano por causa dessa cerimônia no Palácio das Laranjeiras, ela disse a d. Sarah que pretendia viver seus dias limpando o chão, lavando pratos e tocando galinhas. "O sol nunca me pega na cama", pronunciou, solene.
Mônica Manir

24 de nov. de 2012

Se você sofre com gases, entenda o problema e veja dicas para se livrar deste incômodo

Acredita-se que produzimos cerca de três litros de gases ao dia e que de 15 a 20 eliminações de flatos são realizadas por todos, diariamente; porém, em alguns indivíduos esta quantidade é ainda maior

O tema é delicado – pois provoca vergonha e acomete muitas pessoas em diferentes ocasiões. Estamos falando dos gases intestinais, originários do ar que engolimos (aerofagia) ou da fermentação de restos alimentares, no intestino, pelas bactérias que normalmente o habitam.

“O problema aparece, na maioria das vezes, por causa dos carboidratos não digeridos, que acabam fermentados pelas bactérias”, explica o médico gastroenterologista José Antonio Flores da Cunha, da Clínica São Vicente (Gastro Gávea), no Rio de Janeiro.

Ele ressalta que a presença de gases no intestino, assim como sua eliminação por meio de ‘flatos’, é considerada normal – embora fonte de tanto desconforto e embaraço. “Algumas pessoas apresentam uma quantidade maior do problema, que pode causar dor e distensão no abdômen, além de situações de constrangimento. Em geral, são as que priorizam uma alimentação rica em itens sujeitos a maior fermentação”, salienta o gastroenterologista. Na verdade, todos nós produzimos gases quando engolimos ar ou durante a digestão.

“Acredita-se que cerca de 3 litros são produzidos ao dia e que de 15 a 20 eliminações de flatos são realizadas por todos, diariamente. Porém, em alguns indivíduos esta quantidade é ainda maior, o que pode ter a ver com a dieta, como já foi dito, ou predisposição genética ou adquirida, como no caso de intolerância à lactose do leite e ao glúten.” Quando isso acontece, ao ingerir leite e derivados e itens com glúten, a digestão não se dá de forma satisfatória, causando gases e até diarreia.

Algumas medicações, como antibióticos que alteram a flora intestinal ou remédios para diabetes, ou mesmo o estresse favorecem o surgimento do problema, conforme diz Liliane Oppermann, médica nutróloga e ortomolecular, professora da pós-graduação de Medicina Ortomolecular na Fundação de Apoio à Pesquisa e Estudo na Área da Saúde (Fapes).

“Muitos alimentos não são processados adequadamente pela mastigação ineficiente, forma e velocidade com que se come, falta de enzimas digestivas, alterações no pH local e estado emocional, levando a uma fermentação exacerbada.” E tem mais: a falta de atividade física influencia negativamente. “O sedentarismo prejudica o trânsito intestinal, assim como o hábito de ficar muito tempo sentado”, observa o gastroenterologista Rogério Toledo Júnior.


Alimento determina odor

A pergunta que não quer calar: e o que dizer do cheirinho nada agradável desses indesejados gases? A diferença no "aroma", que pode variar de alguns praticamente inodoros a outros super malcheirosos, se deve basicamente ao tipo de alimento ingerido. “Os mais fortes são oriundos da ingestão de itens que contêm enxofre, como algumas comidas em conserva, ovos e rabanete. Mas, é bom destacar, cada caso é um caso, e há variação de resultados de acordo com o indivíduo”, diz Flores da Cunha. “Vegetais como repolho, nabo e couves também costumam liberar enxofre, assim como os grãos apresentam muitos compostos sulfurosos”, completa Oppermann.

Importante: quando a ocorrência exagerada causa sintomas persistentes – como dor abdominal – ou coloca o sujeito em situação embaraçosa frequentemente, é bom consultar um especialista: clínico geral, gastroenterologista, nutrólogo ou nutricionista. Conforme informa José Antonio Flores da Cunha, existem medicações para diminuir a distensão provocada pelos gases, meios de mudar a flora intestinal – com pré e probióticos, por exemplo – e, principalmente, tratamento por meio da reeducação alimentar.

Ele faz uma lista dos itens que mais levam a culpa: leguminosas, como feijão, lentilha e ervilha, porque são ricas em carboidratos; itens que contêm sorbitol, como adoçantes e enlatados, e frutose; bebidas gasosas, alcoólicas ou não; e, claro, leite e derivados em quem tem intolerância à lactose. “Deve-se, evitar, sempre, um cardápio rico em carboidratos. E ficar atento a hábitos que pioram o quadro, como comer rapidamente e mastigar pouco; ingerir poucas fibras, porque pode levar à prisão de ventre; e falar muito durante as refeições, engolindo ar.” Liliane Oppermann ainda acrescenta as frituras e itens com açúcar ou que levam muito fermento na fórmula.
Intestino lento é problema

Até o metabolismo pode ter a ver com o distúrbio. “Indivíduos com ritmo intestinal vagaroso e constipação tendem a permanecer mais tempo com restos alimentares no interior do órgão. Consequentemente, há maior exposição às bactérias e fermentação”, diz o gastroenterologista. Indagado se existem alimentos que combatem os gases, Flores da Cunha diz que o ideal é manter uma dieta balanceada, sem exagero de carboidratos e leguminosas, e com muitos itens ricos em fibras. “Os iogurtes, por causa dos probióticos, chás como os de erva-doce e cidreira, e itens enzimáticos, como mamão papaia e abacaxi, podem ajudar”, completa Liliane Oppermann.

Fernanda Pisciolaro, membro do departamento de psiquiatria e transtornos alimentares da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), cita os alimentos que estão associados à menor produção gasosa – e, portanto, podem entrar no menu de quem quer manter os gases sob controle: leite de soja, suco de soja e iogurte; café descafeinado; torradas, biscoitos salgados com pouca gordura, biscoito de polvilho; pães integral, sírio, sueco e francês sem miolo; queijos magros (minas, ricota, cottage, mussarela); sopas caseiras à base de carnes e legumes; carnes magras, cozidas, assadas ou grelhadas; verduras cozidas (agrião, almeirão, chicória, escarola, espinafre); legumes cozidos (abóbora, abobrinha, batata, berinjela, cará, cenoura, chuchu, cogumelo, inhame, mandioquinha e tomate sem pele e sem semente); frutas cruas ou cozidas (banana-maçã, laranja-lima, maçã, mamão, pêra, pêssego, nectarina); gelatina; e temperos como azeite, limão, salsa, sal, vinagre e óleo vegetal.

Veja a lista feita pela nutricionista da Abeso, Fernanda Pisciolaro: 

ALIMENTOS QUE DEVEM SER EVITADOS

Leite e creme de leite 
Café, chá preto, chá verde e chá mate 
Pães com miolo, pães muito fermentados (como panetone, caseiros e croissants), bolachas e biscoitos doces recheados, biscoitos amanteigados 
Verduras e legumes fermentativos: acelga, alho cru, batata-doce, beterraba, brócolis, cebola, couve-flor, couve-manteiga, pepino, pimentão, rabanete e repolho 
Frutas fermentativas: ameixa, banana nanica ou ouro, caju, caqui, goiaba com semente, jabuticaba, jaca, melancia, melão, morango e uva 
Tortas e massas com muito fermento ou gordurosas 
Feijão, lentilha, ervilha, grão-de-bico, milho e soja 
Carnes gordas: acém, carneiro, costela, músculo, porco e vitela 
Frios e embutidos: bacon, linguiça, mortadela, presunto, salame e salsicha 
Bebidas alcoólicas e gasosas, como água com gás, cerveja e refrigerantes 
Açúcar, doces e bolos 
Chicletes 
Chocolates e achocolatados 
Condimentos: catchup, molho shoyo, molho inglês, mostarda, picles, pimenta-do-reino e pimenta-vermelha 
Sopas industrializadas, temperos prontos em pó, caldo de carne industrializado 
Frituras, itens à milanesa, banha e gorduras em geral 

ALIMENTOS QUE PRODUZEM MENOS GASES
Leite de soja, suco de soja e iogurte 
Café descafeinado 
Torradas, biscoitos salgados com pouca gordura, biscoito de polvilho 
Pães: integral, sírio, sueco e francês sem miolo 
Queijos magros (minas, ricota, cottage, mussarela) 
Sopas caseiras à base de carnes e legumes 
Carnes magras, cozidas, assadas ou grelhadas 
Verduras cozidas (agrião, almeirão, chicória, escarola, espinafre) 
Legumes cozidos (abóbora, abobrinha, batata, berinjela, cará, cenoura, chuchu, cogumelo, inhame, mandioquinha e tomate sem pele e sem semente) 
Frutas cruas ou cozidas (banana-maçã, laranja-lima, maçã, mamão, pera, pêssego, nectarina) 
Gelatina 
Temperos como azeite, limão, salsa, sal, vinagre e óleo vegetal 

Rosana Faria de Freitas

Dedicado carinhosamente à Mimosa

23 de nov. de 2012

O lado obscuro do papai

Afinal, quanto de sua história vale a pena abrir para o seu filho? 
E como falar com ele de eventuais fracassos, excessos ou transgressões?
Filho de um garimpeiro espanhol que buscava diamantes no Centro-Oeste, o arquiteto Gil Lopes, de 55 anos, passou a infância sendo transferido de escola em escola. Às vezes, precisava andar a cavalo quatro horas por dia, duas para ir e duas para voltar, só para assistir a suas aulas diárias. Era um aluno oscilante e raras vezes teve bons professores. Nessas andanças, além de ser mandado embora da escola, acabou proibido, certa vez, de entrar na igreja da cidade depois de pego em flagrante tentando roubar hóstias na sacristia. Fazia sempre isso na hora do almoço. Sem dinheiro nem comida, antes de encarar mais uma cavalgada de volta para casa, ele pegava as tais “bolachinhas” para matar a fome.
Se você é pai de um menino, chegará uma hora em que surgirá o dilema da sinceridade e da transparência. A história de Gil, nesse sentido, é exemplar. Contá-la ou não para o filho? Na ânsia de transformá-lo em um parceiro e querer ajudá-lo a se lançar para a vida, será fácil, em algum momento, perder a medida da informação para mais ou para menos. Afinal, quais os limites do que falar para um garoto sobre sua própria história e suas eventuais transgressões? Se acontecer, por exemplo, um questionamento sobre experiências com drogas, deve-se dar detalhes sobre uma certa viagem na juventude? 

E sobre os fracassos – aquela demissão humilhante por ter destratado um subordinado ou cometido um erro grosseiro, ou as frequentes repetições de ano na escola e a maldita expulsão na 6ª série? “Nunca quis induzir o Ariel, que tem 19 anos, a seguir um caminho que não fosse o dele, e, de um modo geral, na escola, ele tem se saído melhor do que eu”, esclarece Gil. “Mas nunca tive vergonha da minha vida e, dentro de alguns limites, tratei de contar minhas experiências para ele.”
No nosso afã de transmitir conhecimento, sempre nos preocupamos se uma história ou determinada informação pessoal não vai abalar a imagem que o garoto faz do pai, provocar a perda do respeito ou de repente transformar seu companheiro de sempre em um estranho. Ele pode pensar, por exemplo, que o pai foi ou é irresponsável e não tem moral para querer que ele seja bom aluno e muito menos para exigir um alto desempenho escolar. 

Ou, caso perceba uma tolerância a bebidas e outras drogas, se sentir à vontade para experimentá-las e embarcar em outros vícios, já que o homem que deveria ser exemplar fez de tudo quando era jovem e parece ter saído ileso. Fica a dúvida se o mais interessante seria omitir, mentir, dar respostas enviesadas e construir uma imagem mais certinha, afinal a ideia é que o menino enxergue no pai alguém virtuoso. Evitar realçar deslizes hedonistas, pecados e mazelas para moldar uma mentalidade positiva no filho é uma fórmula que passa pela cabeça de qualquer pai normal que quer evitar que seu rebento corra grandes riscos.
O caso clássico de teste de sinceridade é o das drogas. O que fazer quando seu filho perguntar alguma coisa sobre esse assunto? Se você nunca experimentou, fica fácil. Basta dizer que mata, destrói a vida, ou, pior, leva ao crime e deixa a pessoa abobada. E se você já experimentou? E se gostou? Aí pinta o medo de que ele prove e se perca, de influenciá-lo negativamente. Como transmitir conhecimento na medida certa, sem sobrecarregá-lo de informação ou afetar a imagem que ele talvez tenha de você? “Não acho que meu filho precise saber se eu fumei maconha algumas vezes aos 18 anos ou não”, diz o investidor autônomo Renato Schmekel, que, inclusive, escreveu e lançou um livro só para enumerar tudo o que quer que seu filho, Pablo, de 8 anos, saiba até completar 20 anos. 

“Não falo sobre esse assunto e nem vou falar. Considero as drogas um erro e, particularmente, não desejo que meu filho as use.” Em certos casos, Schmekel, de 47 anos, defende um modelo de educação talvez antiquado, em que havia uma relação de respeito e medo. Ele acredita que admitir e dar detalhes sobre certas experiências representa um tipo de permissividade que dará motivos para o filho copiar o comportamento do pai. O trabalho de Renato se chama Livro ao Meu Filho e foi realizado com uma intenção principal: desenvolver no pequeno Pablo a chamada inteligência emocional. 

Renato diz que se despiu das vergonhas e falsos moralismos e se desmistificou para o garoto. “Quis mostrar o quanto fui arrogante e competitivo e dizer que ele, se quiser levar uma vida mais feliz, não deve ser como eu fui”, explica. “Perdi meu pai aos 3 anos e acabei criando uma caixa para me proteger do mundo. Não quero que Pablo passe por isso e se torne defensivo, nem fique a vida inteira pedindo aprovação alheia antes de agir.”
O jornalista Luís Colombini, de 47 anos, também é autor de um livro sobre a relação entre pais e filhos, chamado Aprendi com Meu Pai, uma compilação de 54 depoimentos em que pessoas bem-sucedidas contam a principal lição que receberam do homem mais importante de suas vidas. 
Como regra geral, o que ele percebeu, questionando seus entrevistados sobre cenas fundamentais de seu processo de educação, é que é raríssimo alguém lembrar de um discurso paterno ou de uma situação em que foi dado um ensinamento específico. 
O que marca o filho e realmente funciona na transmissão do conhecimento são histórias vividas e exemplos, como o do empresário José Mindlin, que destacou no seu pai uma característica fundamental: o amor à verdade. “Tento buscar alguma coerência entre minha vida e o que digo e mostro para meu filho, até porque quero que seja uma coisa só”, afirma Colombini, pai de Tales, de 15 anos. 
“Procuro não ir muito além do repertório dele e evito informação excessiva.” Como outros pais de adolescentes, Colombini quer abrir canais de comunicação com Tales e encontrar pontos de identificação. Os vínculos entre os dois são fortes e não falta afeto na relação, mas há uma dificuldade do pai para entrar no universo do filho e dar conselhos ou recomendações mais específicos. Ele sente que sabe pouco sobre Tales e não encontra acesso à sua intimidade. Acha o garoto retraído e fica curioso sobre ele, faz perguntas tentando descobrir coisas, mas, em geral, não é muito bem sucedido. “Outro dia perguntei se ele via algum site pornográfico e ele ficou roxo”, lembra. “Acabou respondendo que sim, mas depois se esqueceu do assunto.”
Para alguns especialistas, o excesso de informação causa mais danos do que benefícios. E, frequentemente, o que leva o pai a falar de mais é a sensação de culpa por não poder estar com os filhos todo o tempo que eles gostariam. A ausência paterna, principalmente quando os pais são separados – caso dos três personagens desta matéria –, costuma ser um catalisador de confidências desnecessárias e até de bobagens. 
De modo geral, um adolescente com uma família que o apoia, que tem um desempenho escolar no mínimo razoável e uma vida feliz não tende a se juntar a um grupo de amigos delinquentes, a se perder com a violência ou em algum vício, os maiores temores de qualquer pai. Ainda que tenham experiências com drogas, dificilmente serão fatídicas. Pais atentos deveriam tentar perceber se os filhos estão felizes e satisfeitos com suas vidas, em vez de querer devassar intimidades. 
“Muitos pais estão confusos, sentem que não passam um tempo adequado com os filhos e, para compensar essa ausência, querem virar ‘amiguinhos’ e falam de mais”, afirma a psicóloga Magdalena Ramos, especialista em terapia de família. “Tem de ficar muito claro que o papel do pai é o de pai, o que não significa ser autoritário, mas é importante colocar-se no seu lugar”. Não vem ao caso, por exemplo, contar tudo o que você fez na vida só para conquistar a intimidade do filho. Também não faz sentido fumar maconha ou usar qualquer droga com o garoto só para mostrar que você é um pai legal. Mais importante, diz Magdalena, é transmitir informações úteis e oportunas e, em vez de passar longos sermões, tentar dar um bom exemplo. O que não dá certo é querer se colocar no lugar de amigo, nem ficar culpado pela falta de tempo.
Outro assunto que testa a sinceridade do papai é o sexo. Em geral, os pais demonstram preocupação com o desenvolvimento da sexualidade dos filhos e querem influenciá-los na masculinidade ou despertar-lhes a “macheza”, como se isso fosse possível. Os filhos, por sua vez, se preservam e tentam viver a própria vida, sem se preocupar com a expectativa alheia. O mais comum é que o pai tente sondar o garoto sobre seu interesse pelas meninas e elogie uma mulher que está passando na rua só para ver a reação do filho. 

Ou conte alguma de suas façanhas amorosas para moldar o menino pelo próprio exemplo. Mais uma vez o risco é acabar falando além do necessário. “Puxei conversa com meu filho sobre masturbação e ele disse que não estava a fim de falar no assunto”, conta Schmekel. “Apesar da idade, ele conversa com os amiguinhos e conhece alguma coisa do tema.” Outro dia mesmo, Colombini notou uma moça japonesa na calçada e perguntou para Tales se ele tinha visto como ela era bonita. Os dois estavam no carro. 

Mencionou que sua primeira paixão foi uma japonesinha. Tales não disse nada. “Não sei nada sobre a vida amorosa e sexual de meu filho”, afirma Colombini, com ar de desolação. “Talvez porque ele seja muito menino.” O arquiteto Gil Lopes enfrenta a mesma dificuldade: tenta avançar na intimidade do filho sem colher qualquer resultado. “O Ariel não pergunta nada sobre sexo e prefere não tocar no assunto comigo. O que eu faço de vez em quando é comprar um estoque de camisinhas e dar de presente para ele”, conta o arquiteto, que concentra suas preocupações nas questões de saúde sexual e de gravidez precoce e evita orientações machistas.

Todas essas iniciativas têm um só objetivo: quebrar barreiras de comunicação e conhecer os dilemas e dificuldades do filho para impedir que ele entre em enrascadas ou apoiá-lo na solução de seus problemas. “Não vejo função pedagógica para histórias muito pessoais ou experiências pesadas”, afirma Lopes. “Acho que os riscos que ele próprio enfrenta ensinam mais para ele do que qualquer coisa que eu possa dizer. Minha experiência nunca vai substituir a dele.” Como outros pais de sua geração, Lopes fez mais do que diz, mas não é hipócrita e nem acredita na mentira ou na omissão como recursos pedagógicos. Sua visão é a de muitos pais hoje em dia: não dar demasiados detalhes ou falar mais do que o filho pergunta. Ele acha que não é preciso se expor de mais para transmitir conhecimentos úteis e ajudar Ariel.
Vicente Vilardaga

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