19 de set. de 2010

Sem GPS

Todas as vezes que ouço falar em livro de autoajuda, me dá vontade de puxar, entre os documentos de minha carteira, um papelzinho dobrado em quatro. Nele estão impressos os versos de Cantares, escritos por Antonio Machado*.
Machado foi um escritor espanhol da chamada Geração 98 (a cifra se refere ao ano de 1898), um dos maiores e mais populares poetas do país. Morreu de desgosto no fim da Guerra Civil espanhola, exilado na França, no povoado de Collioure, a poucos quilômetros da fronteira com sua terra natal. O poema diz mais ou menos o seguinte: "Caminhante, são tuas pegadas o caminho e nada mais; Caminhante não há caminho, se faz o caminho ao andar. Ao andar se faz o caminho, e ao voltar a vista atrás se vê a senda que nunca se há de voltar a pisar." Em poucas linhas, Machado nos diz que na vida não existe disponível um aparelho de GPS que possa nos indicar, a partir do conforto de nossa existência cotidiana ou das sombras de nossa indecisão, qual é o melhor caminho a seguir diante das encruzilhadas que o destino nos coloca.
Que a vida não acontece em linha reta e que ninguém sabe o caminho certo. E, desde o dia em que li esses versos, passei a desconfiar das prateleiras repletas de conselhos mágicos, presos entre as páginas de algum livro, prometendo a garantia de encontrar uma luz que ajude a circular sem preocupações pela selva da existência.
Meu amigo Arnaldo P. me disse uma vez: "Os sinais estão em todos os lugares, é só prestar atenção neles". Tem razão, é disso que se trata. DE TOMBO EM TOMBO "Tudo está conectado como parte de um grande todo, e cada coisa acontece não por si só, mas por causa das outras partes. Quem tem uma boa ideia das coisas e dos lugares será capaz de entender o sentido espiritual da existência." Quem escreveu isso foi Roger Bacon, o Doctor Mirabilis**, frade e filósofo inglês, em 1266. Ele achava que para entender o mundo era necessário prestar atenção a todos os detalhes. Buscar o conhecimento em um lugar só, nos conselhos e na visão de uma pessoa, me parece cômodo demais para o cérebro indeciso. Sem esforço não existe a recompensa. Porque aprender a viver é como aprender a andar de bicicleta. E, que eu saiba, ainda não existe nenhum livro escrito sobre isso. A única maneira de aprender é pedalando até se equilibrar. Não importa, assim como na vida, quantos tombos se leve. *Antonio Cipriano José Maria y Francisco de Santa Ana Machado y Ruiz (1875-1939). Outra frase de Machado é: "Onde houver vinho toma vinho e se não houver, rapaz, o que custa beber água gelada?". **Doctor Mirabilis, em latim, pode ser traduzido como "Doutor Maravilhoso". A obra citada é Opus Magnus. J. R. Duran

Um comentário:

Anônimo disse...

Cada pessoa se encontra em determinado estágio. Acho que sinalizações são sempre bem vindas. Acho que livros de auto ajuda são feitos, como o próprio nome diz,para ajudar. Também acho que existe muito lixo sendo vendido por aí como se fossem livros de auto ajuda. Aliás, em todos os gêneros.
Eu prefiro ler e tentar absorver algo de alguém que vive em uma determinada paz, do que nas palavras de alguém que morreu de desgosto.

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